O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta quarta-feira que o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, "se equivocou" ao confirmar em depoimento, no dia anterior, ter havido menção à Polícia Federal na reunião ministerial do dia 22 de abril. A versão de Bolsonaro, negando ter citado a PF no encontro, contraria também declarações do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, que relatou ter havido citação à PF quando o presidente cobrou relatórios de inteligência.
O vídeo com o conteúdo da reunião faz parte do inquérito que apura as acusações do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro de que Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal. Os ministros Ramos, Heleno e Walter Braga Netto, chefe da Casa Civil, foram ouvidos nesse inquérito, na tarde de terça-feira.
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Ramos fez duas retificações no fim do depoimento, que foi prestado no Palácio do Planalto e durou cinco horas.
Questionado sobre a reunião do dia 22, o general afirmou que Bolsonaro "nominou os órgãos da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Forças Armadas, Polícia Federal e Polícia Militar dos Estados". A indicação ocorreu logo após ele dizer que ouviu o presidente reclamar que precisava "ter mais dados de inteligência para tomada de decisões".
Mesmo assim, Ramos observou que Bolsonaro não citou a possibilidade de mudar o comando da PF e a superintendência do Rio. Ao reler o depoimento, porém, ele recuou e disse não se lembrar se o presidente havia mencionado que, se não pudesse substituir o diretor-geral da PF ou o superintendente, trocaria o próprio ministro.
"Ramos se equivocou. Mas, como é reunião, eu tenho o vídeo. O Ramos, se ele falou isso, se equivocou", contestou Bolsonaro, repetindo não ter citado o termo "Polícia Federal" na reunião. Ao jornal O Estado de S. Paulo, Ramos disse que Bolsonaro foi "induzido ao erro" pela pergunta dos jornalistas, quando apontou equívoco em seu depoimento.
O ministro alegou que, ao falar que poderia interferir em todas as pastas, Bolsonaro citou a mudança da chefia da segurança pessoal. "Ele usou como exemplo: 'Lá no Rio de Janeiro a minha segurança pessoal, que é do Gabinete de Segurança Institucional, se eu quisesse trocar o chefe eu trocaria. Se não resolvesse eu trocaria o ministro'. E o ministro é o general Heleno", disse Ramos.
No depoimento à PF, no entanto, o general Augusto Heleno também disse que Bolsonaro reclamou de "escassez de informações de inteligência que lhe eram repassadas para subsidiar suas decisões, fazendo citações específicas à sua segurança pessoal" e mencionando a Abin, a Polícia Federal e o Ministério da Defesa.
Em mensagem publicada ontem no Twitter, Heleno argumentou que tornar público o inteiro teor do vídeo da reunião, com assuntos confidenciais e até secretos, para "atender a interesses políticos", é um "ato impatriótico, quase um atentado à segurança nacional".
O ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello deu 48 horas, contadas desde ontem, para que Moro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e a Advocacia-Geral da União (AGU) se manifestem sobre o levantamento do sigilo - total ou parcial - da gravação. Moro quer que a íntegra do encontro venha a público. A tendência é que Aras defenda a divulgação de apenas trechos relacionados ao inquérito.
Bolsonaro argumentou que, durante a reunião, fez apenas cobranças sobre sua "segurança pessoal" no Rio. "A Polícia Federal não faz a minha segurança pessoal. Quem faz é o GSI. O ministro é o Heleno", afirmou Bolsonaro, dizendo não ter citado o nome de Moro nem a PF naquele encontro.
'Família'
Segundo relatos de pessoas que assistiram ao vídeo, o presidente associou a mudança na direção da superintendência da PF no Rio à necessidade de proteger sua família. Na reunião, a superintendência fluminense da PF é chamada por Bolsonaro de "segurança do Rio". "Não existe a palavra Polícia Federal em todo o vídeo. Não existe a palavra superintendência. Não existe a palavra investigação sobre filhos. Eu falo sobre segurança da minha família e dos meus amigos. Ou você acha que não há interesse em fazer uma maldade com filho meu?", perguntou o presidente a jornalistas.
No Rio, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) é alvo de investigação do Ministério Público que apura suspeitas da prática de "rachadinha" em seu gabinete no período em que ele era deputado estadual. O governo também tem preocupação com inquéritos do STF que apuram a participação de aliados bolsonaristas em atos em defesa da ditadura e em divulgação de fake news.
Após a nova crise, Bolsonaro disse que não fará mais reuniões do Conselho de Governo com todos os ministros. "Eu decidi: não teremos mais reunião de ministros. Vou ter, uma vez por mês, uma reunião de ministros de manhã, (hasteamento da) bandeira nacional, um café e liberar. O resto vou tratar individualmente com cada ministro. Para evitar esse tipo de problema", declarou. "Não vai ser (reunião) do Conselho. Vai ser um café da manhã, de 8h às 9h." A ideia, de acordo com ele, é fazer uma confraternização. "Bater um papo, um olhar para cara do outro, trocar uma ideia, tá ok?" As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.