A Suprema Corte do estado australiano de Victoria rejeitou nesta quarta-feira (21) o recurso apresentado pelo cardeal George Pell contra sua condenação por agressão sexual de menores, mantendo assim o ex-número três do Vaticano na prisão.
Pell, ex-arcebispo de Melbourne e Sydney, de 78 anos, foi condenado a seis anos de prisão por agressões sexuais a dois coroinhas de 13 anos na Catedral de Melbourne nos anos 1990.
"Seguirá cumprindo sua condenação de seis anos de cárcere", disse a presidente do tribunal, Anne Ferguson, recusando as objeções dos advogados do ex-arcebispo.
Uma multidão formada por vítimas, militantes, advogados e jornalistas aguardava o veredicto nas proximidades da corte, onde foi formada uma longa fila para entrar no prédio, após mais de dois meses de deliberações entre os três juízes responsáveis pela análise do pedido.
Pell, presente no tribunal nesta quarta-feira, abaixou a cabeça em várias ocasiões enquanto Ferguson lia a decisão, celebrada no exterior do prédio por vítimas, militantes e advogados.
Segundo os juízes, Pell poderá solicitar a liberdade condicional dentro de três anos e oito meses, ou recorrer da decisão na Suprema Corte da Austrália.
Pell, que alega inocência, é o maior representante da Igreja Católica a ser condenado por pedofilia. Em dezembro, ele foi considerado culpado de cinco acusações, incluindo ter forçado um garoto de 13 anos a fazer sexo oral em 1996 e ter se masturbado esfregando-se em outro jovem.
Os eventos ocorreram na sacristia da Catedral de São Patrício, em Melbourne, da qual Pell foi arcebispo, onde as duas vítimas se esconderam para beber o vinho da missa. Dois meses depois, Pell colocou um dos adolescentes contra a parede e tocou seu órgão genital.
Os advogados do cardeal encaminharam 13 objeções à decisão de primeira instância, incluindo a de que era "fisicamente impossível" que os supostos atos tenham acontecido em uma catedral lotada.
Também questionaram os períodos em que as agressões sexuais teriam acontecido, alegando que eram "impossíveis" se considerados os deslocamentos dentro da catedral.
Também afirmaram que a pena imposta era questionável, porque se baseava no depoimento de um única vítima sobrevivente. Uma das vítimas de Pell morreu de overdose em 2014 sem nunca ter revelado publicamente os abusos.
O sobrevivente, agora adulto e cujo nome não pode ser divulgado por motivos legais, afirmou que os "estressantes quatro anos de batalha legal o levaram a lugares dos quais temia não conseguir retornar".
O homem disse que a morte do amigo por overdose o motivou a quebrar o silêncio.
"Depois de assistir o funeral de meu amigo de infância [...] sentia responsabilidade de dar um passo à frente", afirmou em um comunicado lido por seu advogado.
A advogada do pai da vítima falecida afirmou que ele sente "como se tivessem retirado um peso de cima".
"Sente que hoje se fez justiça. Tem uma verdadeira sensação de alívio porque George Pell está atrás das grades", afirmou à AFP a advogada, Lisa Flynn.
O Vaticano afirmou em um comunicado que Pell tinha o direito de apresentar o recurso de apelação.
"Neste momento, junto com a Igreja da Austrália, a Santa Sé reafirma a solidariedade com as vítimas de abusos sexuais e seu compromisso em perseguir, por meio das autoridades eclesiásticas competentes, os membros do clero que cometeram abusos", afirmou um porta-voz do papa Francisco, que não se referiu à investigação aberta sobre este caso pelo Vaticano no início do ano.
Os três juízes rejeitaram os argumentos sobre supostos erros de procedimento durante o julgamento de Pell.
Os advogados do cardeal têm prazo de 28 dias para decidir os próximos passos.
O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, anunciou que o país vai retirar de Pell a condecoração da Ordem da Austrália.
Antes da queda em desgraça, Pell viveu uma rápida ascensão. Foi nomeado arcebispo de Melbourne, posteriormente de Sydney e, em 2003, entrou para o poderoso Colégio de Cardeais, o que permitiu que votasse nos conclaves que escolheram os papas Bento XVI e Francisco.
Em 2013, Francisco o selecionou para integrar o conselho de nove cardeais (C9) responsável por ajudá-lo a reformar a Cúria. E em 2014 o pontífice o nomeou secretário de Economia, o que transformou o australiano no número três da Santa Sé.
Mas durante o julgamento, a Santa Sé aproveitou uma ordem que estabelecia o silêncio dos meios de comunicação sobre o processo para afastar Pell de suas funções, sem apresentar explicações. Após a condenação, o australiano foi destituído do carto de secretário de Economia do Vaticano e perdeu o posto no C9. O Vaticano também abriu uma investigação sobre as ações do cardeal.