Os cidadãos e cidadãs que participaram das manifestações do último domingo (16) são, em sua maioria, brancos, de alta renda, têm alta escolaridade e votaram no candidato Aécio Neves nas últimas eleições presidenciais. É o que demonstram pesquisas feitas durante as manifestações na Avenida Paulista, em São Paulo, pelo Instituto de Pesquisa Datafolha, e na praça da Liberdade, em Belo Horizonte, pelo Grupo Opinião Pública, sediado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e que reúne pesquisadores de 20 instituições de ensino superior com o apoio do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas. Os levantamentos mostram um perfil semelhante nas duas capitais.
Em São Paulo, 1.355 pessoas foram entrevistadas e a margem de erro é de 3 pontos percentuais. Em Belo Horizonte, foram 434 entrevistas, com margem de erro de 4,5 pontos percentuais. De acordo com o Datafolha, os participantes da última manifestação têm o mesmo perfil que os das manifestações de março e abril. Em São Paulo, 76% tinham ensino superior, 75% se declararam brancos e 67% disseram ter renda familiar mensal acima de cinco salários mínimos.
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Segundo o Instituto Datafolha, os resultados mostram um perfil diverso ao do paulistano médio. Na população da cidade com 16 anos ou mais, 48% se declaram brancos, 28% chegaram ao ensino superior e 69% têm renda familiar de até cinco salários mínimos.
Em Belo Horizonte, 56,6% disseram ter renda familiar mensal superior a cinco salários mínimos, 64,5% têm pós-graduação, ensino superior completo ou em curso, e 58,8% se declararam brancos. No que diz repeito à posição político-ideológica dos paulistas,14% disseram ser de esquerda, 34% alegam estar no centro e 47% ser de direita. Em São Paulo, 77% declararam ter votado em Aécio no segundo turno da eleição de 2014. Em Belo Horizonte, 79%.
Para a pesquisadora Helcimara Telles, da UFMG, apesar de as manifestações serem compostas majoritariamente por pessoas que votaram em Aécio Neves, os atos não são pró-PSDB e sim “profundamente anti-petistas.” A pesquisa de Belo Horizonte avaliou a presença de eleitores do PT nas manifestações e mostrou que 53,7% dos presentes já votaram no PT alguma vez. Quanto aos sentimentos em relação ao partido, 75,6% disseram ter raiva e 72,1% sentem aversão. Os sentimentos em relação à presidenta Dilma Rousseff são parecidos: 75,6% sentem raiva e 70,7%, aversão.
Helcimara Telles defende que o perfil ideológico dos manifestantes é conservador e de direita. “Uma parte deles, uma direita mais liberal. Outra parte, uma direita mais autoritária”, avalia. “Do mesmo modo que são contra corrupção, são contra políticas de promoção de igualdade social. Há uma forte preferência por políticas de segurança e grande aceitação da pena de morte e do porte de armas.”
Já o cientista político Márcio Malta, da Universidade Federal Fluminense (UFF), observou que os movimentos que convocam os protestos em todo o país e pedem a saída da presidenta Dilma Rousseff não têm consenso sobre as consequências disso. Ou seja, uns defendem que seria melhor que o vice-presidente Michel Temer, do PMDB, assumisse, outros querem novas eleições. “O que de fato temos sempre que resguardar é que existe uma Constituição e ela precisa ser respeitada. Não existe papo de terceiro turno. As eleições, marco legal e democrático, têm que ser respeitadas", ressaltou o especialista, em entrevista à Rádio Nacional AM, do sistema de rádios da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
Na opinião do cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), que acompanhou as manifestações na capital do país, “a única coisa que une todas essas pessoas é a aversão, decepção e chateação pela situação, especialmente a crise econômica”, disse. “Tem diferentes grupos, os que defendem impeachment, intervenção militar e até monarquistas e parlamentaristas, mas o que une todos é a crise econômica e política.” Ele também destacou que ,“dessa vez, foi um pouco diferente porque houve muita crítica ao ex-presidente Lula e muito louvor e elogios ao juiz Sérgio Moro.”
Em Belo Horizonte, diante da pergunta “Nesse momento, o que você acha que seria melhor para o país?”, 40,8% citaram o impeachment da presidenta Dilma, 36,4% a renúncia da presidenta e 13,1% a intervenção militar.
Helcimara avalia que boa parte dos manifestantes são democratas ambivalentes, para quem a democracia é aceitável desde que uma certa ordem seja mantida. “Aceitam a democracia, mas em certas condições e contextos, podem aceitar governos autoritários, ou seja, podem ser uma massa de pessoas que pode ser atraída, no futuro, por candidatos neopopulistas, candidatos que se coloquem acima das estruturas político-partidárias”.
Quando perguntados se “em situação de muita desordem, os militares devem ser chamados a tomar o poder”, 46,8% dos entrevistados disseram que “concordam totalmente/em parte”, 47,2% “discordam totalmente/em parte” e 5,8% “nem concordam/nem discordam”.
Para Helcimara, essa é uma posição antidemocrática. “A própria palavra desordem é muito subjetiva, Hoje, por exemplo, no momento de uma crise política, essa crise pode ser confundida com desordem.”
Participação
A pesquisadora Helcimara Telles atribui a diminuição no número de participantes no ato de domingo em Belo Horizonte, segundo ela, “bem menor que os primeiros”, à radicalização do movimento para a direita.
“As pessoas de centro político tentaram se aproximar das manifestações em março, mas foram afastadas pela radicalização dos manifestantes. Primeiro, há alguns grupos que pedem intervenção ilegal e que questionam a legitimidade do processo democrático, os resultados das urnas e que a cada dia se torna mais antigoverno e anti-PT.”
Para o cientista político David Fleischer, o ato de domingo foi um pouco maior do que o de abril, mas menor que o de março. Ele avalia que uma das peculiaridades do último protesto foi que o PSDB se encarregou de divulgar o evento e vários tucanos estiveram presentes. “E o governo usou isso para mostrar que, apesar ou por causa dessa divulgação, as manifestações foram menores que o esperado."
O cientista político Márcio Malta, do Rio de Janeiro, acredita que o público menor no domingo na manifestação da Avenida Atlântica, em Copacabana, e em outras capitais, traz certa tranquilidade para o governo, que temia participações mais maciças do que nos atos de março e abril. “Era um grande medo que essas manifestações crescessem. Há um cenário de um pouco mais de tranquilidade para o governo tentar articular e movimentar os setores que o têm apoiado."
Para Malta, o movimento arrefeceu como resultado da mudança de postura do governo. “Desde a semana passada, o governo soube, de forma hábil, tecer acordos no Senado, com setores do grande empresariado brasileiro, assim como alguns conglomerados dos meios de comunicação."