Do Sudão à Argélia, onde movimentos populares derrubaram chefes de Estado no poder por décadas, passando pelo Iraque e pelo Líbano, abalados por revoltas sem precedentes, o mundo árabe vive há um ano uma situação que lembra a "Primavera" de 2011.
Naquele ano, vários países árabes foram abalados por movimentos que causaram, por exemplo, as quedas de Zine El Abidine Ben Ali, na Tunísia, e de Hosni Mubarak, no Egito.
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Hoje, a Tunísia é uma exceção, pois continua sua transição democrática, ao contrário de outros países, como Síria, Iêmen, ou Líbia, onde revoltas contra os poderes em vigor levaram a guerras ainda em curso.
- Sudão -
Em 19 de dezembro de 2018, centenas de sudaneses foram às ruas protestar contra o aumento do preço do pão, que triplicou. As manifestações se tornaram semanais e, rapidamente, passaram a exigir a renúncia de Omar al-Bashir, há 30 anos no poder.
Em 6 de abril de 2019, o protesto se transforma em uma grande manifestação sentada (do inglês "sit-in") em Cartum, em frente ao quartel central do Exército.
No dia 11, o Exército depõe Bashir, substituído por um Conselho Militar de Transição. Milhares de manifestantes continuaram sentados diante da sede do Exército, porém, rejeitando o que chamaram de "golpe de Estado".
Homens armados com uniforme militar dispersam o ato com fogo e sangue em 3 de junho.
Em meados de agosto, foi assinado um acordo duramente negociado entre o Exército e os líderes da manifestação, graças a uma mediação da Etiópia e da União Africana.
O país conta com um conselho soberano - uma instância de maioria civil, mas liderada por um militar - para supervisionar a transição. Essa mudança política deve durar pouco mais de três anos e abrir caminho para as eleições.
A repressão contra o protesto deixou mais de 250 mortos, segundo um comitê de médicos ligado aos manifestantes.
- Argélia -
Em 22 de fevereiro, começaram as manifestações contra a candidatura ao quinto mandato do presidente Abdelaziz Buteflika, muito debilitado após um acidente cardiovascular em 2013.
Em 2 de abril, Buteflika renuncia diante da pressão da opinião pública e do Exército.
Os manifestantes continuaram a ir em massa para as ruas todas as sextas-feiras, decididos a acabar com todo "sistema" – uma referência ao aparato burocrático herdado após 20 anos de Presidência de Buteflika. Nesse contexto, o chefe do Estado-Maior do Exército, general Ahmed Gaid Salah, tornou-se o homem forte do país.
Ignorando o movimento de protesto, as autoridades marcam a data da disputa presidencial para 12 de dezembro, depois de terem anulado, por falta de candidatos, um pleito marcado para julho.
- Egito -
Em 20 de setembro, centenas de pessoas protestaram no Cairo e em outras cidades para exigir a renúncia do presidente Abdel Fatah al-Sissi, no poder desde 2014.
Uma manifestação foi organizada à noite na Praça Tahrir, no Cairo, epicentro da revolução de 2011 que acabou derrubando Hosni Mubarak.
Totalmente inesperadas e inéditas sob o governo de Al-Sissi, que realiza uma repressão implacável contra a oposição, as manifestações ocorreram após a divulgação de vídeos de um empresário no exílio que acusa o chefe de Estado de corrupção.
Uma semana depois, após uma onda de prisões com cerca de 2.000 pessoas detidas, apenas algumas manifestações com participação limitada foram registradas.
Aproximadamente 3.000 pessoas foram presas desde 20 de setembro.
- Iraque -
Originado em convocações lançadas nas redes sociais, nasce, em 1º de outubro, um movimento de protesto social no Iraque.
Iniciado em Bagdá, o movimento que exige trabalho para a juventude e a renúncia de líderes "corruptos" se estende a quase todo país. As forças de ordem disparam para dispersar os manifestantes.
O protesto cresce com manifestações gigantescas em Bagdá e no sul. Piquetes e greves paralisam universidades, escolas e a administração pública. Atos noturnos de violência são registrados contra a sede do partido e as milícias.
Desde o início de outubro, mais de 250 pessoas, a maioria manifestantes, foram mortas.
- Líbano -
Em 17 de outubro, o governo anunciou um imposto sobre as chamadas feitas por meio de aplicativos de mensagens na Internet, em um contexto de grave crise econômica. Embora tenha sido rapidamente retirada, a medida provocou a ira dos libaneses que logo saíram às ruas em todo país.
Milhares de pessoas se concentraram em Beirute e em outras cidades, cantando "a cidade exige a queda do regime", principal slogan da chamada "Primavera Árabe". Também bloquearam várias rotas importantes, erguendo barricadas.
Em 29 de outubro, o primeiro-ministro Saad Hariri renunciou. O presidente Michel Aoun foi responsável por lidar com questões administrativas até a formação de um novo governo. No dia seguinte, as barricadas são retiradas.