O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, pode prolongar a presença das tropas americanas no aeroporto de Cabul, onde um guarda afegão morreu nesta segunda-feira (23) em um tiroteio entre soldados e homens não identificados em plena operação de retirada de civis.
"Esta manhã, às 4H13, aconteceu uma troca de tiros entre guardas afegãos e criminosos não identificados", afirmou o exército da Alemanha. Uma nota publicada no Twitter informa ainda que soldados alemães e americanos participaram em "tiroteios posteriores".
Várias pessoas morreram em circunstâncias não explicadas nas imediações do aeroporto, onde prosseguem as complexas operações de retirada. Diante das dificuldades, Biden citou a possibilidade de continuidade no local após 31 de agosto.
"Há conversas em curso entre nós e os militares sobre uma extensão. Esperamos não ter que prorrogar, mas teremos discussões, suponho, sobre o estado do processo de retirada", afirmou no domingo à noite.
Desde que assumiram o poder no Afeganistão em 15 de agosto, os talibãs tentam convencer a população de que seu regime será menos brutal que o anterior, entre 1996 e 2001. Mas suas promessas não conseguem reduzir o desejo de milhares de pessoas de fugir do país.
O governo dos Estados Unidos já retirou quase 30.300 pessoas desde 14 de agosto, informou no domingo a Casa Branca, que espera retirar do país 15.000 americanos e de 50.000 ou 60.000 afegãos. Os países ocidentais já retiraram outros milhares de cidadãos.
No domingo, o chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, considerou "impossível" retirar todas as pessoas até 31 de agosto.
Para reforçar a operação de retirada, Washington ordenou a seis grandes companhias aéreas comerciais que transportem para os Estados Unidos as pessoas retiradas de Cabul que estão em bases americanas no Golfo e na Europa.
Embora a retirada do Afeganistão provoque temores em outros aliados dos Estados Unidos, a vice-presidente Kamala Harris prometeu nesta segunda-feira, durante uma visita a Singapura, um "compromisso duradouro" de seu país na Ásia.
- Ruas de Cabul em relativa calma -
As imagens impactantes no aeroporto, que incluem bebês e crianças entregues a soldados entre muros com arame farpado e homens pendurados em aviões em plena decolagem, rodaram o mundo.
"Não há maneira de retirar tantas pessoas sem dor nem perdas" e sem imagens comoventes, admitiu o presidente americano.
À espera de um milagre, famílias inteiras permanecem entre as cercas ao redor do perímetro que separa os talibãs das tropas americanas nas imediações do aeroporto, onde o acesso é muito difícil.
Biden explicou que o perímetro foi ampliado com a concordância dos talibãs, horas depois de um líder do movimento fundamentalista, Amir Khan Mutaqi, culpar os Estados Unidos pelo caos no aeroporto e alertar que a situação não poderia durar muito.
"Há paz e calma em todo o país, mas apenas no aeroporto de Cabul há caos", disse Mutaqi.
Cabul registra de fato uma relativa calma. Os combatentes talibãs patrulham as ruas e observam de postos de controle.
Nenhum governo foi instaurado, mas as discussões prosseguem entre os talibãs e personalidades afegãs para alcançar um gabinete "inclusivo".
Os fundamentalistas também querem impor a imagem de sua autoridade, com a substituição da bandeira de três cores do Afeganistão pela bandeira branca do movimento
Em uma estrada de Cabul, jovens vendiam bandeiras dos talibãs, que apresentam uma frase com a proclamação muçulmana de fé e o nome formal do regime: "Emirado Islâmico do Afeganistão".
"Nossa meta é hastear a bandeira do Emirado Islâmico por todo Afeganistão", declarou à AFP o vendedor Ahmad Shakib, estudante universitário de Economia.
- Resistência -
Fora de Cabul há alguns focos de resistência contra os talibãs. Alguns ex-soldados do governo se reuniram no vale de Panshir, ao norte de Cabul, conhecido como um reduto antitalibã.
Algumas contas do Twitter favoráveis aos talibãs afirmaram que o novo regime enviou centenas de combatentes ao vale depois que "as autoridades locais se negaram a entregá-lo pacificamente".
Os islamistas "reuniram forças perto da entrada de Panshir", tuitou Amrullah Saleh, vice-presidente do Afeganistão no governo anterior, que se refugiou na região.
Um dos líderes do movimento em Panshir, denominado Frente de Resistência Nacional (FRN), é Ahmad Masud, filho do conhecido comandante antitalibã Ahmad Shah Masud, assassinado em 2001.
A FRN está preparada para um "conflito de longo prazo", disse à AFP o porta-voz Ali Maisam Nazary, caso um compromisso não seja alcançado com os talibãs sobre um governo descentralizado.
Outra fonte afirmou que milhares de afegãos chegaram a Panshir para lutar contra o novo regime ou para buscar refúgio. "Estamos preparados para defender o Afeganistão e alertamos para um banho de sangue", declarou Masud no domingo ao canal Al Arabiya.