Duas ações dos protagonistas do “Itaipu Gate” são decisivas para a montagem do quebra-cabeças no escândalo que envolve os governos do Brasil e Paraguai.
Sempre juntos nas rodadas de negociações com o país vizinho, Alexandre Giordano, (suplente do senador Major Olímpio-PSL-SP), e os sócios do Grupo Léros, realizaram movimentações societárias em épocas próximas. E sempre próximas ao calendário das eleições de 2018.
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Figura central do “Itaipu Gate”, Alexandre Giordano se desincompatibilizou da participação em uma empresa que tinha entre as atividades registradas na Receita Federal o “comércio atacadista de energia elétrica”.
A retirada do nome na sociedade ocorre em 16 de abril de 2018, dez dias depois da filiação no PSL, onde viria a ocupar o lugar em que segue, suplente de senador do Major Olímpio(PSL-SP). A filiação é feita na véspera do 7 de abril, último dia permitido no pleito que passou. No lugar de Alexandre Giordano na “Enfermade Empresa Brasileira de Bioenergia” ficou como único sócio o filho Lucca Giordano, então com 17 anos, emancipado pelo pai em registro no cartório. O endereço da empresa é o mesmo do diretório do PSL na capital paulista.
As outras peças fundamentais na engrenagem do “Itaipu Gate” são os empresários Kléber Ferreira da Silva e Adriano Tadeu Deguirmendjian, sócios do Grupo Léros, que comercializa energia. Teoricamente, seriam concorrentes do negócio do qual Alexandre Giordano se retirou e deixou o filho. Mas estão inseparavelmente unidos na empreitada paraguaia.
De acordo com os documentos obtidos pela Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo na Junta Comercial do Panamá, os sócios do Grupo Léros abriram a empresa Novel Industries Inc naquele país em 3 de outubro de 2018. Exatos 4 dias antes do primeiro turno de 2018, quando o Major Olímpio foi eleito senador por São Paulo e carregou na primeira suplência Alexandre Giordano. Os dois tem ainda como sócio na empreitada no conhecido paraíso fiscal Celso Bispo dos Reis.
Kléber Ferreira e Adriano Tadeu Deguirmendjian aparecem no documento da junta panamenha com o endereço paulistano do Grupo Léros. Já Celso Bispo dos Reis forneceu como endereço um local no Butantã (SP), onde na verdade consta o “Spa Della Rosa”, cabelereiro, manicure e pedicure, que está em nome de Larissa Deguirmendjian, também acionista do grupo Léros.
Não é crime ter empresa no exterior, desde que declarada a Receita Federal. A reportagem tentou contato com Kléber Ferreira para saber a situação da Novel Industries mas não obteve resposta. (Ver “outro lado” ao fim da reportagem).
Quando utilizadas para fins ilícitos, empresas offshores servem para ocultação de patrimônio, de sócios eventuais, ficando em nome de parceiros ou laranjas, sonegar tributos, enviar para o exterior bens de origens ilícitas, fazer com que capital ganho em transações ilícitas no exterior nem passe pelo Brasil. Nesses casos, são chamadas de “empresas de prateleiras”, por só existirem no papel e serem constituídas anteriormente, com os novos sócios comprando elas já montadas. A Novel foi aberta em 2013 e os sócios da Léros entraram em 2018, como está na reportagem.
Os sócios do Léros foram levados a tiracolo por Alexandre Giordano na mesa com os representantes paraguaios da hidrelétrica de Itaipu e indicados pelo político para serem os beneficiários de um acordo comercial na “Ata Bilateral” entre os dois países, como mostra uma série de reportagens publicadas no Jornal ABC, do Paraguai, feitas pela repórter Mabel Rehnfeldt. As matérias revelam conversas via WhatsApp de autoridades paraguaias que falam em negócios privilegiados para a Léros por indicação de Alexandre Giordano e citam a “família Bolsonaro por trás” dos atos que indicam a Léros.
CRONOLOGIA:
6 de abril de 2018: Alexandre Giordano se filia ao PSL
7 de abril de 2018: encerra o prazo de filiações para a eleição
16 de abril de 2018: Os registros da Junta Comercial de SP apontam a saída de Giordano da empresa “Enfermade”
16 de abril de 2018: No mesmo dia, o filho de Giordano, Lucca, de apenas 17 anos, aparece como único sócio
3 de outubro de 2018: os sócios do Grupo Léros abrem uma offshore no paraíso fiscal do Panamá
7 de outubro de 2018: o Major Olímpio é eleito senador por São Paulo e Alexandre Giordano fica com a suplência
28 de outubro de 2018: Jair Bolsonaro (PSL) ganha a eleição presidencial
12 de março de 2019: Jair Bolsonaro se encontra com o presidente paraguaio Mario Abdo Benitez para discutirem a revisão do “Acordo Bilateral” entre os dois países. O Brasil pressiona para que cláusula que impede a venda de energia para uma empresa privada brasileira a preço de custo seja retirada. Para essa empresa depois revender a preço de mercado no Brasil.
9 de abril de 2019: em voo privado, o suplente de senador do PSL, Alexandre Luiz Giordano chega ao Paraguai acompanhado de Adriano Tadeu Deguirmendijian, sócio da Léros e mais dois
10 de maio de 2019: exatas duas semanas antes da assinatura do Acordo Bilateral, Alexandre Luiz Giordano (PSL) se encontra na Tríplice Fronteira com Pedro Ferreira (então presidente da ANDE, a estatal de energia paraguaia) e com Joselo Rodriguez (asessor jurídico do vice-presidente Hugo Velásquez)
24 de maio de 2019: O Acordo Bilateral é assinado pelos dois presidentes
25 de junho de 2019: Nova viagem em voo fretado de Alexandre Giordano junto com Adriano Tadeu Deguirmendijan, da Léros, para encontrar os representantes paraguaios
24 de julho de 2019: Pedro Ferreira, presidente da Administração Nacional de Eletricidade (Ande, a estatal paraguaia do setor), renuncia por discordar dos termos e se recusar a assinar acordo
27 de julho de 2019: O Grupo Léros oficializa em documento proposta de compra de energia ao governo paraguaio:
29 de julho de 2019: outras autoridades paraguaias ligadas ao “Itaipu Gate” renunciam
31 de julho de 2019: os partidos de oposição anunciam o pedido de impeachment do presidente paraguaio.
1º de agosto: para escapar do impeachment, o presidente do Paraguai anula o acordo. Contrariando o que deveria se esperar do chefe de estado brasileiro diante de decisão unilateral prejudicial ao país, Bolsonaro aceita a anulação
Nos documentos vazados na série de reportagens de Mabel Rehnfeldt, um envelope enviado pelo correio por parte de representantes da estatal paraguaia tinha o nome de Alexandre Luiz Giordano como destinatário. O endereço, rua General Ataliba Leonel 1205 (bairro de Santana), além de constar com sala da empresa do suplente de senador, também é do diretório do PSL.
A Agência Sportlight constatou que um outro endereço da empresa de Alexandre Giordano, na mesma rua só que no 1223, 6º andar, também é usada como sede do PSL, como mostra a intimação da comissão de ética do partido para a líder do governo Joice Hasselmann feita em junho de 2018.
Outro lado:
Alexandre Giordano, suplente de senador do PSL-SP: A reportagem tentou contato com Alexandre Giordano, sem êxito. Caso seja feito contato, as respostas serão aqui publicadas.
Grupo Léros: A reportagem enviou e-mail para o sócio Kléber Ferreira da Silva mas não obteve resposta. Caso seja feito contato pela outra parte, as respostas serão aqui publicadas.
Por Lúcio de Castro, da Agência Sportlight