Articular com a política e o eleitorado pernambucano tem sido um passo crucial para a trajetória dos que irão encarar o pleito presidencial em 2022. Não somente aos presidenciáveis, Pernambuco possui um pólo de interesse a muitos parlamentares e equipes que desejam integrar chapas e coligações de peso no país. O estado é marcado por um conservadorismo expressivo, mas que é contraposto por alguns dos movimentos de militância da esquerda mais antigos do país e pelo legado da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que marca gerações e divide a população geral.
Somente no último semestre de 2021, Pernambuco recebeu visitas de três presidenciáveis, todos da “terceira via”: os governadores Eduardo Leite e João Doria, ambos recebidos pela colega de partido, a prefeita de Caruaru Raquel Lyra, do PSDB, no Porto Digital do Recife; e o ex-juiz Sérgio Moro (Podemos), para lançamento de um livro no Shopping RioMar, também no Recife. Além destes, ministros bolsonaristas compareceram à capital pernambucana para cumprimento de agenda e propaganda do governo de Jair Bolsonaro (PL), como foi o caso de Gilson Machado (Turismo) e Marcelo Queiroga (Saúde).
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Por concentrar zonas eleitorais de peso e um cenário político marcado por figuras vitoriosas tradicionais, Pernambuco possui uma movimentação bem independente diante do restante do país, o que é aproveitável para quem precisa expandir a própria campanha a fim de garantir uma vitória eleitoral.
O doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Pedro Gustavo Soares, explica como as oligarquias pernambucanas cumprem esse papel de atrativo, em um espaço marcado por sobrenomes — Campos, Arraes, Coelho, Lyra — da capital ao Sertão.
“Quando falamos de oligarquia, falamos de um campo muito bem sedimentado e que é difícil de desmontar. É necessário um jogo político muito grande. O segundo ponto é que estamos falando de algo enraizado em várias esferas da política, e que vai além da política. Uma oligarquia, quando consegue alcançar determinado poder dentro dessas inúmeras circunferências, é porque ela tem uma história pra contar. Ela tem uma herança. Então, nada melhor do que se alinhar a uma hierarquia, uma vez que exista apoio e domínio poder daquela região. Por essa razão, Pernambuco se torna um estado extremamente querido pelos presidenciáveis. Não apenas por eles, pelos partidos também”, afirma Soares.
O especialista também destaca a chegada da centro-direita, antes muito movida pelos interesses de grupos expressivos no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a Pernambuco e ao Nordeste, e esclarece que o alinhamento ao conservadorismo é um comportamento padrão desta ala política.
“Não é porque estamos falando de 2022 e século 21, que todas aquelas questões que desde o início da República são relevantes, vão ser abandonadas. Muito pelo contrário. Quando a gente classifica de 'centro' um perfil político, uma ala da política brasileira, esse centro é histórico. O que a gente percebe é que o centro continua com aquele mesmo comportamento desde quando o Brasil se tornou República. [De tratar] dessas necessidades básicas, que tiram a dignidade do outro. E quando atinge a dignidade, atinge a vida, atinge direitos fundamentais. Essas questões serão fundamentais para a sustentação de um tipo de mobilização política que é feita pelo pelo centro, e que vai continuar”, continua o cientista.
Pernambuco pode ser “mural” de realizações políticas
Além da questão oligárquica, Pernambuco possui outros atrativos no campo do desenvolvimento socioeconômico. Litorâneo, atrai pelo potencial turístico e também logístico, tendo um porto privilegiado geograficamente e útil ao setor industrial. O Recife tem um dos parques tecnológicos mais produtivos do país, o que é o caso do Porto Digital, além das possibilidades para o Sertão, que é alvo de promessas de melhorias que perpassam décadas e que também funciona como palanque eleitoreiro de muitos políticos.
“Os conglomerados industriais, como as indústrias sediadas em Suape e o estaleiro, a Jeep, o polo médico; no Sertão, a questão da água e a questão agroexportadora, que gira em torno do perímetro de Petrolina; são todos aspectos atraentes para todos os nomes [da disputa eleitoral]. E isso nada mais é do que uma consequência da época do governo Lula. Foram políticas extremamente positivas e preservadas, na época de Eduardo Campos, pelo PSB, porque fez bem, fez com que seus candidatos ganhassem e permanecessem em um palanque político”, diz Soares.
Governo Lula
O lulismo ou lulopetismo pode ser considerado o maior obstáculo dos demais pré-candidatos no estado. Não só Pernambuco é a casa do patrono petista, nascido em Caetés, no Agreste, como possui histórico de vitórias com folga nas eleições anteriores. Em 2002, quando foi eleito ao primeiro mandato, o ex-presidente venceu em solo pernambucano com 57.067% dos votos válidos. Em 2006, quando foi reeleito, obteve 78,483% dos votos válidos, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Para Pedro Soares, não há dúvida de que o protagonismo das eleições de 2022, em Pernambuco, ficará por conta de Lula e Bolsonaro. No entanto, acredita que a má condução da gestão bolsonarista, sobretudo na economia, conduzirá o conservador a um fracasso na região com impacto tão grande quanto o que existiu para adversários anteriores. O cientista não vê a terceira via como um ser crescente no cenário local, apesar de reconhecer que Sérgio Moro poderá fazer barulho.
“Apesar dos números nos mostrarem hoje que Bolsonaro venceu em algumas cidades do Nordeste, como no Recife, a maldade, ignorância e incompetência dele foi tamanha, que eu acredito que Lula volta agora de maneira avassaladora. Por conta da herança e da articulação com políticos que Lula está adequando, ele fará com que sua herança volte de uma maneira que a incompetência de Bolsonaro não vai ter terreno”, continua o cientista político. Soares acredita também que a terceira via será acusada de ter apoiado a “incompetência” do atual presidente.
E acrescenta: “Se essa coligação de Lula souber tirar proveito das questões positivas do legado que foi deixado no Nordeste à época e permanece, ou que foi destruído pelo atual governo, creio que eles têm uma chance de vitória enorme”.
Por fim, o Recife volta a ser abordado pelo cientista. A cidade e autodeclarada “capital do Nordeste” garantiu vitória a Bolsonaro contra o petista Fernando Haddad em 2018, apesar do professor ter vencido no estado. À época, Bolsonaro chegou a 43,14% dos votos válidos, enquanto Haddad somou 30,05%. A vitória do atual presidente também se repetiu em outras cidades importantes da Região Metropolitana, como Olinda e Jaboatão, e no Agreste, em Caruaru.
“Apesar de Recife ser uma cidade extremamente conservadora, racista e patriarcalista, acredito que a pauta econômica foi tão pesada na última eleição e não foi resolvida, pelo contrário, foi um massacre, um desastre do governo Bolsonaro; que será determinante para que Lula vença com sobra”, finalizou.
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