Como tornar temas como sustentabilidade e preservação ambiental mais atraentes e acessíveis ao grande público? Melhor que isso, como proliferar as ideias de conservação, proteção do meio ambiente e motivar as pessoas a compartilhar informações sobre o uso correto de recursos hídricos e como a reciclagem e a invasão de áreas protegidas pode ser prejudicial? Essas são as perguntas que motivaram o artista plástico potiguar Oziel de Souza a adotar uma nova proposta: se tornar um indivíduo não governamental. Os ING´s, sigla pela qual são conhecidas essas pessoas, assim como as ONG´s, têm como objetivo doar seu tempo e trabalho para construção de um mundo melhor, seja no campo ambiental, social, político ou, até mesmo, reunindo os três em uma única proposta.
Morador do bairro que margeia o rio Cabuçu, situado ao pé da Serra da Cantareira e, consequentemente, seu parque estadual, Oziel conversou com o Leia Já sobre o projeto da ONG Movimento Cabuçu, da qual é um dos fundadores, sobre sua luta pela criação e preservação de uma área de proteção ambiental no local e sobre o trabalho que realiza junto à comunidade desde sua chegada na década de 70:
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Leia Já: O que é e quando começou o Movimento Cabuçu?
Oziel de Souza: Nós somos ING´s, começamos em 2009 focando na resolução de problemas locais relativos ao meio ambiente e que afetavam a comunidade, tais como preservação da fauna, flora, lençol freático, que contemplam a nossa região, ressaltando a importância de uma das poucas reservas de mata atlântica que ainda existem, na porção do Parque Estadual da Cantareira que fica no Jardim Cabuçu (Guarulhos). Em 2009 conseguimos criar uma APA – Área de Proteção Ambiental – e desde então lutamos para protegê-la através das manifestações teatrais de rua que promovemos.
LJ: Quais os projetos que você desenvolve dentro do Movimento Cabuçu?
OS: Eu sempre atuei como artista plástico, poeta e ator. Dentro do projeto, eu levo o meu conhecimento das artes para alunos da rede pública estadual e os cidadãos do bairro através de oficinas, com a intenção de criar um vínculo entre o espaço de preservação e a comunidade, para que ela entenda a real importância que aquela área tem e o quanto afeta suas vidas.
LJ: Faz tempo que você atua na comunidade?
OS: Quando me mudei para o bairro, nos anos 70, a intenção já era trabalhar esse raciocínio; eu queria me tornar personagem para absorver melhor o conhecimento da região e passar aos demais, as gerações que viriam a seguir... queria absorver o pensamento da comunidade e que eles, em contrapartida, absorvessem o meu também. Por isso, participei de protestos e manifestações com a comunidade na luta por moradia e serviços básicos como saneamento, água e iluminação pública.
LJ: Existe apoio financeiro para o projeto?
OS: Em outro momento, nós chegamos a ter incentivos financeiros por parte do governo municipal, porém, isso acabou podando algumas de nossas ideias e tivemos que abrir mão dessa ajuda. Eu tenho uma visão bem clara do que queremos fazer, mas, de repente, nos vimos obrigados a tangenciar um pouco nossas ações para agradar aqui e ali. Por essa razão, hoje desenvolvemos inúmeras ações para arrecadar o necessário para manter o movimento, com captação própria de recursos e ajuda da população, através das organizações de bairro e demais representantes da comunidade.
LJ: Como fica a questão da moradia nessas áreas, que também são carentes?
OS: Primeiramente nós temos que separar as coisas: mesmo a população mais carente tem que entender que não se pode morar em uma APA. Ninguém tem o direito de destruir o que é de todos. Essas áreas servem para benefício de todos, portanto, todos devem usufruir dela da melhor forma, que é preservando. Conservar não é uma questão somente ambiental, tem a ver com saúde pública, bem-estar e qualidade de vida. Uma das problemáticas é que temos algumas pessoas interessadas na exploração imobiliária do local, ou seja, tomar parte da área para depois construir empreendimentos maiores como condomínios ou prédios, desvirtuando de uma ideia inicial de moradia popular.
LJ: Como você avalia o trabalho que vem sendo feito na região?
OS: Como artista, eu dirigi meu esforço no intuito de fazer com que meu trabalho propagasse e conscientizasse as pessoas com maior velocidade e atingindo mais pessoas, uma vez que eu entendo que a manifestação artística não tem fim, eu passo a visão e ela continua, independente da minha ação, se espalhando. A arte popular tem um ciclo que não se encerra em si, ela vai além de quem a cria, além da peça que se cria. O teatro de rua, em especial, absorve a realidade a sua volta e a recria, isso é muito sério: a pessoa consome aquela arte ao passo que também é consumida.