A responsabilidade sobre o sucesso no enfrentamento à Covid-19 passa pela competência das autoridades sanitárias municipais e do compromisso da gestão com a população. Abaixo do índice de isolamento social de Pernambuco, a cidade de Goiana, na Mata Norte, teve três licitações suspensas por indícios de superfaturamento e sofre com a desgastante troca de secretários na Saúde.
Afastado desde 2018 para tratar a doença de Crohn, informada em sentença da 2ª Vara Cível de Goiana, o prefeito Osvaldo Rabelo Filho (MDB) arrependeu-se da escolha no comando da pasta e deu início a uma série de mudanças já no primeiro semestre de gestão. Em apenas seis meses do mandato iniciado em 2017, três gestores lideraram a Saúde no município.
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Falta competência
A dança das cadeiras foi mantida como um hábito pelo prefeito em exercício, o vice Eduardo Honório, que oficializou a última troca em plena pandemia, após a passagem de oito secretários de Saúde. “Falta competência dos próprios secretários. Apoio eles tiveram o suficiente”, aponta Honório, que não revelou por quem os profissionais foram indicados.
“Infelizmente as pessoas que tentaram tocar a Secretaria de Saúde não tiveram um bom desenvolvimento [...] você tem que ter pessoas com uma visão boa pra Saúde e, até agora, a gente não encontrou essa pessoa que soubesse desenvolver o município”, frisou o vice, que está nos últimos meses de mandato, mas admite que Goiana precisa reforçar a Saúde.
Secretário da Saúde sem conhecimento da área
Apesar da capacidade do Ministro (interino) da Saúde, Eduardo Pazuello, ser criticada pela falta de experiência na área, Honório foi na mesma direção e nomeou para a pasta o administrador Carlos Gondim Torres Filho, no dia 3 de agosto deste ano. Formado pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), o único contato do atual secretário com a área foi quando colaborou em uma empresa do ramo farmacêutico.
Atualmente cursa pós-graduação em Gestão Pública à distância pela Uniasselvi, e o currículo é preenchido por uma passagem no banco Itaú. Carlos também prestou serviços no 1º Tabelionato de Notas e Registro De Imóveis de Goiana pertencente ao seu pai Carlos Torres, um dos apoiadores da candidatura de Osvaldo. “Às vezes a pessoa tem um currículo muito bom, mas quando chega na hora de executar o serviço, cadê ele executar?”, questiona.
Sem prática em gestão pública ou saúde básica, Honório o classifica como um “jovem dinâmico” e afirma que está satisfeito com os resultados – mesmo sem pontuá-los - em pouco mais de um mês de atuação. O prefeito Osvaldo preferiu não comentar sobre a rotatividade dos nove secretários e a incerteza quanto à aptidão de Carlos Godim.
Já o prefeito em exercício entende que o nomeado faz um bom trabalho pelo suporte da esposa e cirurgiã-dentista Adrianna Rodrigues. “Ele tem a esposa que é formada em dentista e tem uma boa bagagem. Ele tem tudo para dar certo”, disse.
Procurado pelo LeiaJá, Carlos Gondim Torres Filho não atendeu aos telefonemas para comentar sua nomeação, mesmo sem conhecimento prático ou teórico. Populares e vereadores reclamam da morosidade do município contra a pandemia e indicam que a maior intervenção da Prefeitura é uma barreira sanitária fixada no mercado público aos sábados. Em contrapartida, Honório indica que a maior dificuldade para conter o avanço da doença é conscientizar a população, que desobedece as regras de distanciamento.
O índice de isolamento levantado pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) em parceria com a InLoco revela que apenas 33,9% dos habitantes cumpre a medida. Segundo o último boletim epidemiológico, 1.144 pessoas já foram contaminadas pela Covid-19 e 74 não resistiram às complicações da doença. Goiana segue com 54 casos suspeitos.
Idoneidade questionada no combate à pandemia
Contestada por falta de investimento no setor, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) revela que a Prefeitura de Goiana recebeu R$ 4.577.434,27 federais e R$ 172.497,42 estaduais para arcar com as despesas da pandemia. Após fiscalização, a entidade suspendeu três licitações por indícios de superfaturamento e prejuízo à competitividade para a obtenção de melhores preços.
O TCE ainda informa que o Fundo Municipal de Saúde do município reservou R$ 13.802.644,81 para gastar com a Covid-19 e gastou apenas R$ 6.822.250,80 até o momento. “Por que foi cancelada? A gente quando percebe que algo tá indo errado, que tá com as cotações a cima daqueles valores, a gente tem que cancelar por que não vai fazer besteira não. A gente não pagou, se você olhar cancelou, mas não pagou”, garante o vice prefeito, que garantiu desconhecer o levantamento.
“Todo esse dinheiro a gente realmente destinou ao coronavírus, não foi desviado para outro local não. Se for esse ‘dinheirozinho’ que a gente vem pegando, a gente vem dando o destino certo”, defende-se Honório.
Após o cancelamento das compras, o TCE calcula uma economia de R$ 2.099.058,48 aos cofres públicos. As licitações investigadas foram negociadas antes da entrada de Carlos Filho e são referentes à aquisição de mil cestas básicas no valor de R$57.500; à compra de merenda para estudantes da educação básica por R$ 427.172,25; e a terceira envolve equipamentos e mobílias hospitalares, e materiais de proteção individual, cotados por R$2.305.865,98. “Se houve isso aí e tiver danos ao município, se abre uma sindicância e quem for responsável que responde pela mesma”, disparou.
Denúncias de corrupção pairam sobre Goiana desde a entrada da chapa eleita. Antes de ser afastado por questões de Saúde, a chapa do prefeito Osvaldo sofreu a abertura de um processo de impeachment, proposto por unanimidade dos 15 parlamentares da Câmara de Vereadores.
Na ocasião, a gestão era acusada de supostas irregularidades no contrato do serviço de coleta de lixo que, em um intervalo de dois anos, duplicou os gastos. Para suspender o processo, o desembargador Francisco Bandeira de Mello alegou que os crimes pontuados pela Câmara estariam classificados como comuns e não crimes de responsabilidade.