Pedro Severien é uma figura querida no meio do audiovisual pernambucano. Carismático, encabeça lutas pungentes do setor, no Estado, como a valorização da TV Pública e o cumprimento dos compromissos do governo com as ações de fomento à arte e cultura. Como cineasta, estreou com o bem sucedido curta-metragem "Carnaval Inesquecível" em 2008. Ano passado, lançou sua quarta obra, "Loja de Répteis", outro curta.
Segundo o próprio cineasta, "Todas as Cores da Noite" não foi pensado para "sair do forno" cinco anos após o início de sua produção. Mas foi isso que aconteceu. Entretanto, a impossibilidade de concluir o "longa debut" antecipadamente fez com que o diretor pudesse amadurecer as ideias apresentadas no corte final do filme. E o que o público do VIII Janela Internacional de Cinema do Recife viu foi mais uma produção ousada de Severien, que abre mão de convenções da sétima arte para situar seu espectador em situações e ambientes que, perspicazes, emulam o real, mas que não, necessariamente, o são. Assim como "Loja de Répteis", a obra traz referências do cinema de horror, suspense, mas se distancia de qualquer formalismo que esses gêneros pudessem impor.
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As "Todas as Cores…" começam explodindo a tela como num sonho (ou seria pesadelo?) aos moldes do real/onírico de David Lynch, gélido como Jonathan Glazer pensou seu "Sob a Pele" e incômodo como grande parte da filmografia de Gaspar Noé. A experiência visual ancora no inventivo trabalho de som, que busca elementos na música eletrônica e clássica para uma mixagem deveras perturbadora. Assim, Severien resolve chafurdar o subconsciente de seus personagens, cujas motivações aparentes apenas mensuramos, assim como quem são, mas que ali estão: vivendo a sinestesia da noite e fazendo do dia o prolongamento do conflito entre Eros e Tânatos das horas de "escuridão", da vida que se repete em ser trágica.
Na composição de contraluzes intensos, a fotografia do filme reflete a neutralidade da existência como o movimento do 'mar', que nunca explica seu sentido, repentino, espontâneo, mas ainda assim repetitivo, sinônimo de vida e morte. As "cores", no filme do Severien, após o primeiro momento do filme, parecem surgir alternadas, como numa viagem gradativa, que altera a percepção da luz por sobre os objetos. Dessa forma, a obra constrói planos inspirados. A narrativa revela personagens mergulhados em remorsos, medos, culpas, mas sem conceder ao espectador a chance de criar qualquer vínculo emocional com essas figuras. Elas surgem, decidem, falam, dormem, choram, morrem, ressurgem e tornam a morrer e, como o mar em movimento, o filme continua, intacto.
"Todas as Cores da Noite" ainda reflete a recorrente expectativa da sociedade sob a figura da mulher, mas ainda os perigos, a violência, a repressão que ofusca as personagens, confunde-as, aniquila-as. Após a primeira exibição, a obra quase clama por um segundo encontro. Um convite generoso do filme que se abre à construção de sentidos por parte de seu espectador. Severien mostra-se seguro de sua liberdade narrativa e não abre mão do experimentalismo para desenvolver suas discussões. O Janela Internacional de Cinema do Recife continua até domingo (15) para, até lá, fazer do cinema, existência, em todas as noites e cores. O evento ocorre nos cinemas da Fundação Joaquim Nabuco e no Cinema São Luis.
Com a palavra o diretor Pedro Severien, no vídeo a seguir:
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