Apesar de ser levado pelo gancho da festa da carne, profana, o Carnaval é uma festa política e de manifestações sociais. Desde os nomes e origem dos blocos, às fantasias e marchinhas fazem parte da manifestação política que é o Carnaval. Na Região Metropolitana do Recife há diversos blocos que mostram o sentido político e de manifestações da festa, como os blocos ‘Eu Acho é Pouco’, ‘Xingou… Bateu… É Penha!’, ‘Bloco do MST’, ‘Siririx’, ‘Vacas Profanas’.
As marchinhas, por exemplo, surgiram da marcha portuguesa e, apesar de produzir músicas engraçadas e letras com duplo sentido, sempre foi um estilo musical aberto à crítica social, sendo utilizado assim até hoje em vários blocos do Carnaval pernambucano. Mesmo não se sabendo, de fato, sobre o que diz a primeira marchinha de Carnaval feita no Brasil, “Ô abre Alas”,ela foi escrita pela feminista Chiquinha Gonzaga, em 1899, numa época de maior intolerância e preconceito com as mulheres.
##RECOMENDA##O historiador e cientista político Alex Ribeiro explicou que a festividade tem origem cristã e que os dias que antecediam a quaresma serviam para as pessoas extravasarem e saírem dos costumes cristãos, até chegar ao Brasil no século XX e as manifestações políticas começarem a acontecer. “A festa se afastou do cristianismo e abraçou outras crenças. Se tornou múltipla culturalmente e religiosamente”, afirmou.
O próprio corpo se tornou símbolo de manifestação no carnaval, explicou Alex. “O corpo se tornou um ato político. A maneira de se vestir, a liberdade de se expressar com o corpo mostra outra face do carnaval. Isso acabou incomodando os conservadores. Por isso que, para muitos, a maneira de se fazer carnaval é um ato de resistência”, complementou.
Em 2017, por exemplo, os foliões do Carnaval de Olinda repercutiram as manifestações políticas de 2016, quando houve o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT). Houve críticas à reforma da Previdência do ex-presidente Michel Temer (MDB). Em crítica a cena local recifense, também houve um alerta aos ataques de tubarão na praia de Boa Viagem, no Recife.
No Carnaval de 2019, em Olinda, foliões aproveitaram a irreverência da festa para se manifestarem sobre a situação política do Brasil da época com os escândalos e memes proporcionados pela família Bolsonaro. Como um rapaz que estava vestido de laranja e com uma placa: “chupa Queiroz”, e uma mulher vestida em alusão à barbie e com uma plaquinha com os dizeres “O PT destruiu a minha vida”.
Já no ano passado, em 2022, artistas e participantes do desfile da Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, fizeram protesto contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) com gritos de “fora Bolsonaro”, “olê, olê, olê, olá, Lula, Lula”. E, neste ano, após Lula (PT) ter sido eleito presidente pela terceira vez, o Carnaval de São Paulo iniciou com manifestações pró-Lula, com foliões entoando gritos a favor do presidente no centro da capital paulista. Foliões de todo o Brasil se fantasiam de presidentes ou ex-presidentes como uma forma de pedir a sua saída ou de brincar com a chegada.
No entanto, vale ressaltar que a política falada no carnaval é totalmente diferente da política falada pelos próprios políticos, levando em conta a relação de quem faz a festa com os Poderes. O especialista explicou que há, de fato, essa diferenciação, já que a parte política (dos políticos) não está envolvida na cultura carnavalesca. “O Carnaval popular alcança os demais setores da sociedade. Para muitos destes agentes públicos, a festa de Momo é algo a ser respeitada, celebrada, mas ainda existe uma distância considerável entre entender as manifestações carnavalescas, vindas das periferias, a importância religiosa além do cristianismo, como também a manifestação política”, detalhou.