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Imagine a seguinte situação: é 19 de abril, Dia do Índio. Nas escolas infantis, ao redor do Brasil, as crianças estarão com os rostos pintados de tinta guache, usando cocares feitos de papel sulfite - elementos que deveriam ser entendidos enquanto cultura e não fantasia - e fazendo danças circulares numa "homenagem" aos povos originários do país, celebrados nesta data. Desde o "descobrimento" das terras, que hoje conhecemos como nação brasileira, os povos autóctones são vistos pelas lentes do estereótipo, como se fossem personagens de livros de história, presos em 1500, num misto de mitificação e romantização.  

O estudante Tarisson Nawa, de 21 anos, entende bem sobre esse senso comum arraigado na cultura brasileira. Indígena da etnia Nawa, do estado do Acre, ele é incisivo ao declarar: "Existem muitos equívocos com relação às populações indígenasque precisam ser desfeitos, desmistificados. É preciso retirar essa ideia de que o indígena para ser indígena, tem que estar na aldeia, caçando, ou nú, usando cocar e pintura. Não. Ele vive na sociedade. E por viver em sociedade a gente troca simbolicamente as nossas experiências com outros indivíduos. Isso faz com que nós possamos ressignificar nossas expressões socioculturais".

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Essa ressignificação vem acontecendo desde que os primeiros povos tiveram de deixar suas terras originais em busca de sobrevivência. Segundo dados levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atualmente, 47,3% dos cerca de 900 mil índios que vivem no Brasil, moram em áreas urbanas. "Isso tudo é produto de um deslocamento, de uma saída das terras que esses povos tradicionalmente ocupavam, por terem sido expulsos. Eles buscaram na cidade melhores condições de vida. Na atualidade, onde estão esses indígenas? Eles moram nas periferias e muitos não têm espaço. Então, eles não se reconhecem e isso acaba silenciando muitas questões que deveriam ser pautadas em relação ao indígena na cidade", diz Tarisson.

As cidades, majoritariamente habitadas por não-índios, acabam por não terem um preparo para receber as populações indígenas, que consequentemente acabam passando por esse "processo de negação e silenciamento da sua identidade", como conta o estudante. Ele próprio, crescido fora da aldeia por conta do processo de deslocamento de sua família, compreendeu este mecanismo e hoje faz o caminho inverso de boa parte de seus parentes: "A minha família perdeu o vínculo com a aldeia - embora se reconheça ainda hoje. A minha intenção é retomar as práticas e expressões socioculturais do meu povo, a nossa tradição".   

Riqueza étnica

Segundo estudo realizado pelo IBGE, publicado em julho de 2016, o Brasil contabiliza 305 etnias com cerca de 274 línguas. Esses números fazem do país um dos lugares com maior diversidade sociocultural do planeta. A etnia Nawa, de Tarisson, é uma delas. Ele conta um pouco sobre o seu povo: "Nossa terra tradicional fica no município de Mâncio Lima, no estado do Acre, o município mais ocidental do país. A nossa etnia foi reconhecida pelo estado brasileiro no início deste século, lá pelos anos 2000. A gente vem de uma história de violência grande, como na maioria dos casos dos povos indígenas, de violência tanto física quanto simbólica. Fomos considerados um povo extinto. A emergência identitária, acontecida por volta de 2000, fez com que nosso povo se tornasse politizado e reconhecesse que nós somos indivíduos, sujeitos de direitos." O estudante diz que, desde o reconhecimento, há 17 anos, os Nawa estão na luta pela demarcação de suas terras: "Na formação dos seringais do Acre nós fomos expulsos da nossa terra e tivemos que morar em outros locais". Este é o mesmo problema enfrentado por tantos outros povos indígenas que vivem ao redor do país.

Indígenas na universidade

Desde 2012, a Lei de Cotas (lei 12.711), determina que as instituições de ensino superior federais devem reservar vagas para estudantes pardos, negros e indígenas vindos da rede pública de ensino. Hoje, 36 das 59 universidades federais do país oferecem algum tipo de ação afirmativa de reserva de vagas em seus processos seletivos.

Tarisson Nawa cursa jornalismo na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Para ele, ocupar este espaço vai muito além de adquirir conhecimento: "Estar na universidade é o Estado Brasileiro reconhecendo que existem sociodiversidades no país - que existem povos indígenas, negros, ciganos, várias expressões sócio-culturais - e essas expressões só têm a contribuir com esse modelo acadêmico que é pautado num conhecimento europeu que negligencia, silencia e nega o saber das populações tradicionais. Então eu, na posição de indígena, venho justamente pra tensionar esse poder ideológico dentro da universidade e inserir as demandas das populações indígenas enquanto um tema que deve ser pautado dentro dessa formação do saber". O jovem pretende seguir a vida acadêmica e fazer uso da sua posição para dar voz e vez aos seus: "No decorrer dessa minha vivência acadêmica pretendo usar meus conhecimentos na tentativa de quebrar preconceitos. Quero defender as causas dos meus parentes."

Originalmente publicado em www.unama.br

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Localizado na zona portuária do Rio de Janeiro, um mural com 3 mil metros quadrados ganhou vida e cores pelas mãos do artista Eduardo Kobra. O mural faz parte do Boulevard Olímpico, que é uma das áreas de lazer gratuita, revitalizada especialmente para os jogos.

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A obra denominada Etnias, contém cinco retratos coloridos que representam os povos que formaram a miscigenação da cultura brasileira e também fazem referência aos arcos olímpicos.

O público que passeia pelo local, está sempre em busca do melhor ângulo para registrar o momento e eternizar a lembrança.

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