O legado musical de Luiz Gonzaga já mostrou ser capaz de transcender o tempo. A força do baião, do xaxado e do xote atravessou décadas e enfrentou altos e baixos em diferentes épocas, mas o forró resistiu e hoje, em Pernambuco, o estilo mostra-se revigorado e continua atraindo adeptos. A sonoridade, os trejeitos e o figurino criados por Gonzaga ainda inspiram inúmeros músicos, que seguem seus passos 65 anos depois da gravação da clássica Asa Branca.
A ocasião dos cem anos de nascimento do ‘Inventor do Nordeste’ mostra a longevidade da sua obra. O impacto da novidade trazida por Luiz Gonzaga ainda ressoa, inspirando poetas e cantadores, compositores e até artistas pop. Referências à obra de Gonzagão podem ser identificadas no liquidificador sonoro da Tropicália, movimento feito em sua maioria por nordestinos emigrados, assim como o próprio Seu Luiz. Em Pernambuco, na década de 1970, a geração Udigrudi também mergulhou na sonoridade do forró, misturando ritmos e melodias nordestinos com a psicodelia e o rock.
Assim como o baião foi, nas décadas de 1940 e 1950, a “dança da moda”, seu prestígio diminuiu com a chegada de outras modas musicais, especialmente a Bossa Nova e a Jovem Guarda. Os anos de 1980 também não foram os mais pujantes para o forró que, no entanto, nunca saiu dos ouvidos e vitrolas de vários brasileiros e começou a ser conhecido no exterior, particularmente na Europa.
Nos início dos anos 2000, o sucesso nacional do grupo paulista Falamansa colocou novamente o forró na moda, fazendo com que muitos jovens – nordestinos ou não – se interessassem em ouvir as músicas do Rei do Baião. Essa movimentação ficou conhecida como “Forró Universitário”, e deu novo gás à estética condensada por Luiz Gonzaga em sua música. Em Pernambuco, terra natal de Luiz Gonzaga, houve uma revalorização da tradição cultural local, impulsionada pelo Manguebit, que também alimentou o forró, a partir da segunda metade dos anos 1990.
O baião, o xote, o xadado, a música de forró nunca deixou de fazer parte ambiente sonoro pernambucano. “Pernambuco sempre cultivou essa história, Recife é a única capital que sempre manteve acesa a chama do forró”, afirma o cantor e compositor Maciel Melo. O centenário de nascimento de Luiz Gonzaga, que acontece neste ano de 2012, também foi um impulso para o estilo, já que inúmeras homenagens foram feitas ao Rei do Baião durante todo o ano. CDs, DVDs, releituras, shows temáticos e os mais variados eventos citaram, reverenciaram, valorizaram a figura e a poética de Gonzagão, incluindo a Escola de Samba Unidos da Tijuca, campeã do carnaval carioca deste ano com o enredo ‘O dia em que toda a realeza desembarcou na avenida para coroar o Rei Luiz do Sertão’.
“Temos trios de forrozeiros na Áustria, Alemanha, Holanda, Portugal, Inglaterra, França e outros países”, avisa o cantor Santanna, que considera bom o momento para o forró. “Sobrevivo disso e não tenho do que reclamar”, completa. “O forró está bombando em Nova Iorque”, reforça Tereza Accioly, presidente da Associação de Forrozeiros Pé-de-serra e Ai(link do blog), citando a existência de casas de show na maior cidade do mundo tocando a sonoridade nordestina.
“Até quem não gostava de forró está cantando luiz gonzaga”, brinca Maciel: “Espero que isso não fique só neste ano, que continue como a gente sempre fez”. Se o forró se manteve vivo, durante a última década e meia foi ganhando corpo e se profissionalizando. No Recife, um exemplo claro deste momento é exatamente a Associação dos Forrozeiros Pé-de-serra e Ai, que reúne grande parte dos artistas, dá suporte jurídico, atua junto ao poder público e mantém um programa de rádio tocando, entrevistando, noticiando e propagando o universo forrozeiro.
Hoje a associação tem mais de mais de 200 artistas cadastrados. “O legado que Gonzaga deixou para nossos artistas é tão grande que a gente consegue sobreviver dele o ano todo”, explica a presidente Tereza Accioly, avaliando que o forró vive um bom momento, apesar de haver uma deficiência de espaço no rádio. Há um circuito de casas de show especializadas que mantém um programação permanente e consegue atrair público e artistas, que têm trabalho e conseguem viabilizar sua carreira.
Tereza reforça a importância dos músicos se profissionalizarem, conhecerem a figura jurídica do empreendedor individual, e ressalta que há uma nova geração interessada em deixar viva a musicalidade do forró. “Os jovens forrozeiros estão muito integrados às redes sociais, estão se divulgando e formando a plateia deles na internet”, diz.
A longevidade da música depende também da sua capacidade de se adaptar e atrair artistas jovens. “O forró é um mundo musical muito rico. É xote, xaxado, galope, aboio...”, explica o compositor Miguel Marcondes, do grupo Vates e Violas. Para ele, há quem se prenda a apenas uma fase da longa trajetória de Luiz Gonzaga, que foi naturalmente incluindo novos instrumentos e sonoridades ao baião com a passagem do tempo. “Tem que misturar as sonoridades, dar uma oxigenada no forró”, opina Marcondes.