"Os países não devem interferir no trabalho dos inspetores" da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), advertiu em entrevista à AFP seu novo diretor, o argentino Rafael Grossi, depois que o Irã retirou a credencial de uma funcionária da instituição.
"É essencial que se respeite a imunidade dos nossos inspetores. Os países não devem interferir no trabalho dos inspetores e esta é a mensagem que enviamos a nossos colegas iranianos", explicou o diplomata argentino, que assumiu o cargo na terça-feira (3) na agência da ONU encarregada de promover o uso seguro e pacífico das tecnologias nucleares.
A agência da ONU é encarregada de comprovar no terreno se Teerã aplica o acordo sobre seu programa nuclear, assinado em 2015 em Viena com as grandes potências para garantir que o país não vá desenvolver armas atômicas.
O regime de inspeção de instalações nucleares iranianas, posto em marcha pelos inspetores da AIEA, é o mais severo do mundo.
Em um momento em que o acordo se encontra debilitado, desde que os Estados Unidos se retiraram em 2018 do tratado e Teerã adotou medidas em represália, um incidente incomum causou mal-estar entre a AIEA e o Irã no fim de outubro.
Uma revista a uma inspetora na entrada da fábrica de enriquecimento de urânio de Natanz (centro) fez soar o alarme, provocando preocupação de que pudesse levar com ela "um produto suspeito", denunciou Teerã.
As autoridades iranianas retiraram a credencial desta inspetora. A AIEA considerou "inaceitável" que Teerã tivesse "impedido momentaneamente" sua funcionária de deixar o país.
"É um assunto sério", declarou Grossi, que disse esperar que este "incidente lamentável" seja um caso isolado.
"Os inspetores não devem ser intimidados", acrescentou, assegurando que a agência da ONU, cuja sede fica em Viena, "apoiará sempre" suas equipes, encarregadas de controlar as instalações nucleares no mundo.
- Energia nuclear e clima -
O presidente do Parlamento iraniano, Ali Larijani, advertiu no domingo que o país está disposto a "reconsiderar seriamente" seus compromissos com a AIEA se os europeus decidirem ativar um mecanismo previsto pelo acordo de Viena, que possa levar a um restabelecimento das sanções da ONU.
"Prestamos atenção a estas declarações [...], mas estas não afetam de forma direta o que fazemos", afirmou Grossi, para quem este tipo de ameaças se inscrevem dentro "de uma discussão política" entre o Irã e as grandes potências, entre as quais não está a AIEA.
A agência defende seu status de instituição técnica, independente de pressões diplomáticas, as quais são numerosas no expediente iraniano.
Antes de uma possível visita ao Irã, para a qual ainda não há data, Rafael Grossi indicou nesta terça-feira que planeja um encontro esta semana com representantes iranianos que se encontram em Viena para uma reunião com os europeus, Rússia e China sobre o futuro do acordo de 2015.
O novo diretor da AIEA, de 58 anos, fará sua primeira viagem à COP 25, em Madri, na semana que vem.
Muitos ambientalistas consideram a energia nuclear uma fonte de contaminação e de insegurança.
Rafael Grossi disse estar disposto a iniciar um debate com todos, destacando que "a energia nuclear, é um fato científico, libera um nível muito baixo de emissões" e que isto poderia "ser parte da solução" na luta contra as mudanças climáticas.
"Se os países industrializados, altamente dependentes da energia nuclear [...] deixarem de usar a energia nuclear, a situação ambiental na questão das emissões seria catastrófica", acrescentou.