As organizações de defesa dos operários da área têxtil de Bangladesh atribuem a responsabilidade pelos inúmeros acidentes neste lucrativo setor aos patrões sem escrúpulos, à negligência das autoridades e à indiferença das empresas de roupas ocidentais, mais preocupadas com os custos de produção do que com a segurança no trabalho.
Ao menos de 200 pessoas morreram no desabamento na quarta-feira de um prédio em que funcionavam as oficinas de confecção, um novo acidente neste setor que, no ano passado, gerou 20 bilhões de dólares em exportação e contribuiu para que a etiqueta "Made in Bangladesh" possa ser encontrada em quase todos os lares ocidentais.
Alguns empregados do setor têxtil que trabalhavam no prédio Rana Plaza de Savar, na periferia de Daca, recebiam 37 dólares por mês para fabricar peças destinada, entre outras marcas, à britânica Primark.
Em novembro, um incêndio em uma unidade de confecção perto de Daca cobrou a vida de 111 empregados, em sua maioria mulheres, o que provocou uma polêmica sobre as condições de trabalho e de segurança dos operários desta indústria, a segunda mais importante do mundo.
A oficina não contava com brigadas de incêndio, as saídas de emergência estavam bloqueadas e os operários receberam a ordem de permanecer em seus postos apesar da fumaça, pois seus chefes afirmaram que se tratava apenas de um exercício de emergência.
Sobre o acidente de quarta-feira, apesar de uma evacuação ter sido realizada no dia anterior depois que os empregados constataram fissuras no prédio, seus chefes pediram que eles voltassem ao trabalho.
"O governo promete há anos tomar medidas significativas para melhorar a segurança nas oficinas de confecção, mas jamais cumpriram com suas promessas", denuncia Scott Nova, diretor executivo do grupo de defesa dos operários, o Worker Rights Consortium, com sede em Washington.
"O governo acredita que regras sobre o direito trabalhista, que poderiam aumentar os custos da produção, fariam com que as marcas e vendedores varejistas (estrangeiros) fossem para outro lugra", explica Nova.
Apesar de uma série de inspeções nas milhares de fábricas do país depois do drama de novembro, um novo incêndio em janeiro, em uma fábrica que fornece produtos para a espanhola Inditex, número um mundial do setor têxtil e dona da marca Zara, deixou oito mortos entre os operários, dois dos quais eram menores de idade.
Há 30 anos Bangladesh se lançou à confecção para exportação e conseguiu fazer do setor uma ponta de lança de sua economia.
Anos de crescimento a dois dígitos graças às 4.500 unidades têxteis ajudaram este país desfavorecido da Ásia do sul e com 153 milhões de habitantes a reduzir sua pobreza endêmica a um ritmo mais rápido que seu vizinho, a Índia.
Em um relatório sobre o setor, a consultora McKinsey classificava recentemente Bangladesh como a "futura China", prevendo que suas exportações têxteis poderão triplicar para 2020.
Para o vice-presidente da Associação de Fabricantes e Exportadores do Setor Têxtil em Bangladesh, Shahidullah Azim, os acidentes se devem a fábricas cada vez mais velhas, que deveria passar por reformas.
Meenakshi Ganguly, diretora da Human Rights Watch para a Ásia do Sul, acredita, por sua parte, que os consumidores deveriam ajudar a pressionar as marcas para que a indústria tome consciência da situação.
"Vimos isso com o comércio de diamantes nos países em guerra: quando os consumidores tomaram consciência da situação, evitaram comprar diamantes cuja origem estava relacionada com distúrbios, então a indústria foi obrigada a mudar", enfatizou.
Meenakshi Ganguly denuncia também a intimidação em relação aos militantes que defendem os operários, alguns dos quais foram assassinados ou julgados.
Babul Akhter, diretor da Federação de Operários do Setor Têxtil e da Indústria em Bangladesh, não acredita que a justiça será feita no acidente do Rana Plaza.
"Aqui, os empresários do setor têxtil estão acima das leis", afirmou.
"As marcas ocidentais também são cúmplices porque fecham os olhos às práticas dos fabricantes. Assim como os fabricantes, os varejistas utilizam a mão de obra de Bangladesh como uma máquia de fazer dinheiro", conclui Akhter.