Tópicos | Eleição judicializada

A ausência de uma discussão concisa sobre os problemas do país deve ser predominante durante o debate presidencial nas eleições deste ano, que tende a ser judicializada. Um retrato claro disso está nos argumentos expostos na pré-campanha, quando o foco dos comentários dos pré-candidatos passou a girar em torno da participação ou não do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa, ponderações sobre a prisão após condenação em segunda instância e as recentes ações da Operação Lava Jato.   

Na avaliação do cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Adriano Oliveira, até uma decisão final da Justiça Eleitoral sobre a legalidade do registro da candidatura de Lula - enquadrado na Lei da Ficha Limpa por ter sido condenado pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro - a eleição será judicializada, inclusive pela intervenção do Ministério Público que deverá questionar a legitimidade do líder-mor petista no pleito. 

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Segundo o estudioso, além disso, existe a possibilidade da Lava Jato deflagrar operações durante os 45 dias de campanha, aquecendo ainda mais a disputa. “Neste caso teremos uma eleição judicializada e policializada. O candidato do PT, que poderá ser Fernando Haddad ou Jaques Wagner, também pode provocar algum tipo de atenção por parte do Ministério Público [para o surgimento de investigações]”, argumentou. “Isso vai demandar respostas dos competidores e, com isso, a apresentação das propostas talvez seja secundária”, completou. 

O fato de levar a retórica pela linha da defesa ou acusação diante da judicialização, segundo o cientista político, prejudicará a explanação das propostas. “Podemos verificar uma campanha sem propostas, mas isso não é apenas pela judicialização. É muito mais factível o candidato apresentar emoção e ações que possam provocar o eleitor do que propostas factíveis. O candidato, antes da proposta, busca emocionar. Não adianta uma proposta fria. Tem que debater economia, segurança pública, serviços públicos, mas de maneira que venha provocar emoção ao eleitor”, ponderou Adriano Oliveira. 

A provocação emotiva do postulante ao eleitor, mesmo que seja para se defender de denúncias ou apontar que o adversário é alvo de processos, também foi ressaltada pelo professor do departamento de comunicação da Universidade de Brasília (UnB) e analista de debates eleitorais, Paulo José Cunha. Na ótica do especialista, isso faz com que o eleitor não dê ênfase a ausência das propostas no debate e se paute pelos discursos anticorrupção que forem apresentados pelos candidatos. 

“Temos percebido ao longo de todo este processo, tanto no país quanto no Congresso, uma enorme desconexão da classe política com os temas mais relevantes que interessariam na eleição deste porte. Um levantamento rápido do discurso dos presidenciáveis dificilmente vai conseguir identificar propostas sobre temas como educação, saúde e segurança. Historicamente esses temas não chamam muita atenção mesmo, porque o voto no Brasil é muito mais emocional do que racional, o que implica no desprezo dessa condição em que o processo se transcorre”, observou. 

Lembrando o fato de que na eleição de 2014 a notícia de que Marina Silva (Rede), então candidata pelo PSB, teria aceito orientações do Pastor Silas Malafaia e mudado diretrizes do seu programa de governo gerou um escândalo e sucumbiu as iniciativas apresentadas pela postulante, Paulo José Cunha disse que no pleito deste ano “fatos que deveriam ser acessórios”, como defesas próprias, vão virar determinantes no debate.  

“As pessoas estão mais interessadas em um performance de cada candidato do que ele propõe e se compromete. Hoje isso se tornou mais agudo, em função da situação policial, jurídica e judicial que o país atravessa nesse momento com Lava Jato e a prisão de Lula”, salientou. 

“Essa questão [da apresentação das propostas]  não vai ser relevante para a definição de voto, deveria ser teoricamente, mas o eleitor está mais preocupado com outras questões como a corrupção. Nas pesquisas de assuntos de interesse dos eleitores ela está acima do desemprego, que está em alto índice no país. Vai pesar muito essa questão da corrupção”, completou o professor. Paulo José Cunha ainda observou que o descaso da população com a política vai reforçar ainda mais a problemática.

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