É possível imaginar pessoas livres dentro de uma instituição destinada a reeducar adolescentes em conflito com a lei? Na Fundação de Atendimento Socioeducativo, a Funase, de Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife, sim. Lá, um grupo de jovens está provando o quão libertária a música pode ser através da banda fundada por eles, que não poderia ter outro nome: Liberdade.
O grupo de forró, com pouco mais de um ano de formação, é resultado das oficinas de música promovidas pelo agente socioeducativo Artur Silva, que dá aulas durante dois dias na semana para os adolescentes da instituição. Mas, a ideia sofreu resistência a princípio, tanto dentro quanto fora da unidade: "Eles não acreditavam que a música faria alguma diferença", relembra. O professor, entretanto, não desistiu e após uma espera de 12 meses teve a autorização para iniciar o projeto.
##RECOMENDA##Os resultados brotaram rapidamente e o Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) Abreu e Lima, que se encontrava então envolto em um momento tenso de muitas rebeliões e violência, viu seu cenário mudar. Daí veio a criação da Banda Liberdade, que só corroborou com a melhoria da unidade e dos jovens que ali cumpriam suas penas: "A banda influencia tanto na parte cognitiva deles, enquanto alunos, como no comportamento deles e dos demais. Os que participam do grupo têm atividades externas, têm tratamento 'diferenciado' por conta de serem representantes do projeto. Então eles têm possibilidade maior de sair, de fazerem cursos. Eles acabam se tornando referenciais dentro das alas. O comportamento, a desenvoltura e a progressão deles na medida socioeducativa ela cresce por conta do trabalho da música", explica Artur.
Ao lado do agente trabalha o professor Clóvis Benvindo. Ele leciona matemática no sistema socioeducacional e se dedica aos ensaios da banda em seus dias de folga. O trabalho voluntário é feito com um sorriso no rosto do educador: "A maior recompensa nossa é ver esses meninos mudando de comportamento e dar esperança para cada um deles", diz. Artur complementa o colega: "Não é somente tirar o jovem da criminalidade, do ato infracional, mas é propor a ele alguma coisa. Tem que ter algo para substituir aquela representação que tem as drogas ou o ato infracional e a música faz isso. A música tem esse poder libertário e eles começam a sonhar".
Os dois, que também integram a banda - um no teclado e vocal e o outro no contrabaixo -, não hesitam em demonstrar o carinho pelo grupo. "A banda é uma família, então cada um de nós temos que nos ajudar, para que a gente possa alcançar nosso objetivo", diz Clóvis. Artur acrescenta: "Tem que ser pai, irmão e amigo, tem que ter esse lado de afeto".
Jovens músicos
Atualmente, a banda Liberdade é composta por 10 adolescentes, entre 16 e 18 anos, além dos professores. Destes, apenas três tinham algum envolvimento com música antes de entrarem na instituição, por meio da capoeira que praticavam. Eles reconhecem e comemoram, a transformação que a música vem provocando em suas vidas. "A pessoa fica mais leve, tira (da cabeça) altos pensamentos bobos de fazer besteira. A banda mudou a minha vida. Meus pensamentos agora são só para fazer coisa boa", diz L., de 18 anos. S.J., também de 18, o membro mais antigo do grupo, explica como acontece a mudança: "A gente chega aqui todo marrento, não quer ir pra escola, não quer fazer curso, mas a cada dia vai mudando o pensar, a convivência. A banda mudou meu jeito de ser, eu era mais fechado agora converso, brinco. Mudou em mim e em vários também".
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Os rapazes da Banda Liberdade costumam se apresentar dentro do Case Abreu e Lima e fora também. No último dia 5 de outubro, eles fizeram um show de pré-lançamento de seu primeiro CD, na Faculdade Facigma, no Recife. O álbum está em processo de finalização e logo será lançado oficialmente. Os meninos estão ansiosos por este primeiro trabalho e, também, esperançosos de que ao término do cumprimento de suas medidas socioeducativas a música siga com eles do lado de fora da unidade: "A música mudou nossa vida. Se Deus permitir eu for pra rua com força e saúde, e se aparecer umas oportunidades eu me apresento, digo que participei do projeto social com a banda. Se der certo, vou viver na música", diz S.J.
Música e trabalho
Além de contar com o trabalho voluntário dos professores, o projeto musical do Case Abreu e Lima e a Banda Liberdade contam com doações e empréstimos de instrumentos para manter as suas atividades. O CD que está prestes a ser lançado tem como objetivo divulgar este projeto e os próprios meninos, no intuito de viabilizar sua inclusão em cursos, estágios e até empregos. Além disso, o grupo está aberto a convites para apresentações em eventos por toda a Região Metropolitana do Recife. Interessados podem entrar em contato com a instituição através dos telefones (81) 3184-2410 e 3184-2411.
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