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Data determinada pela Lei Nº 9.970/2000 como o Dia Nacional de Combate à Exploração e ao Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes, o 18 de Maio relembra o caso de Araceli Cabrera Crespo, criança de 8 anos que foi sequestrada, violentada e carbonizada em Vitória, Espírito Santo. O crime ocorreu em 1973. Passados 49 anos, os suspeitos ainda estão impunes.
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Como forma de manter viva a memória de Araceli, dar visibilidade ao tema e conscientizar a respeito, foi criada a campanha Maio Laranja, que busca discutir e provocar conversas sobre a violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil.
Abuso sexual e exploração sexual: como diferenciar? O abuso ocorre quando a vítima é utilizada na prática de atos de cunho sexual, seja por um adulto ou adolescente com idade ou nível de desenvolvimento que o coloca em posição de responsabilidade, confiança ou poder. Pode envolver o uso da força física, ameaças ou exploração da autoridade. Enquadra-se nos artigos 214 e 218 do Código Penal como, respectivamente, atentado violento ao pudor e corrupção de menores, e na Lei N 8.072/1990 como crime hediondo, o que aumenta a pena.
A exploração sexual caracteriza-se quando crianças ou adolescentes são utilizados para troca ou obtenção de lucro – financeiro ou de outra natureza – por meio de turismo sexual, tráfico, pornografia ou rede de prostituição.
Nem todo ato de abuso ou exploração enquadra-se como pedofilia, patologia sexual do grupo das parafilias (distúrbios psiquiátricos caracterizados por fantasias sexuais recorrentes e intensas com pessoas, animais ou objetos) que possui critérios estabelecidos pela Associação Psiquiátrica Americana – American Psychiatric Association – no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, de 1994. Para ser classificado como pedófilo, o indivíduo precisa ter 16 anos ou mais e possuir, no mínimo, cinco anos de diferença em relação à idade da vítima. Portadores da doença podem apresentar desejos e fantasias sem se tornarem abusadores.
A neuropsicóloga Atanuita Rangel fala que a vítima de violência sexual pode não apresentar sinais físicos, mas é possível que manifeste por meio de choro, angústia, ansiedade, mudança no comportamento, perda do controle de urina e fezes devido a fatores emocionais, doenças sexualmente transmissíveis e irritação ou machucados nas partes íntimas, por exemplo.
Atanuita também aponta o perfil do abusador e/ou pedófilo. “Ele pode ter uma vivência como uma figura paterna ou amiga. Alguns procuram por crianças de pais solteiros ou mesmo famílias em que os responsáveis não sejam tão disponíveis para dar atenção. Um abusador de crianças e/ou adolescentes, normalmente, usará de artifícios como jogos, atividades e linguagens de interesse da idade para ganhar a confiança e enganar a vítima”, informa.
As marcas deixadas pelo abuso sexual podem perdurar até a vida adulta. De acordo com a neuropsicóloga, é comum que a vítima tenha pesadelos persistentes, baixa autoestima, desconfiança nos relacionamentos, dificuldades para se alimentar (o que pode gerar transtornos, como anorexia ou bulimia), maior tendência para uso de drogas e comportamentos de risco.
“Buscar justiça é uma das formas de se proteger e de tratar os traumas decorrentes da violência vivida. Ajuda psicológica, apoio de familiares e amigos e envolvimento em programas de prevenção são algumas das alternativas de ajudar o adulto a continuar sua vida sem se sentir paralisado por pela dor causada pelo abuso”, afirma.
Desinformação e mitos
Atanuita diz que os mitos sobre o tema surgem devido à falta de compreensão das verdadeiras causas do abuso, ao medo de represálias ou de que nada será feito pela vítima, à vergonha da exposição ou ao constrangimento por ter vivenciado os fatos.
“Por se tratar da violação de direitos é importante desmistificar algumas crenças em torno deste tema, como: acreditar que o abuso se dá por pessoas desconhecidas; que autor é sempre uma pessoa mais velha, um doente mental, psicopata, alcoólatra ou homossexual; que a criança mente e inventa ter sido abusada; que há consentimento por parte do adolescente ou que houve facilitação por parte dos responsáveis das crianças; que o abuso sexual acontece, na maioria dos casos, longe da casa da criança ou do adolescente; que as vítimas do abuso sexual são de famílias de nível socioeconômico baixo ou que a maioria dos casos são denunciados”, pondera.
Ana Júlia Nogueira, advogada criminalista, informa que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990) e o Código Civil (Lei Nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) amparam, por meios legais, crianças e adolescentes na sociedade em diversas áreas, inclusive quando envolve crimes sexuais. “Em casos judiciais em que há um menor (qualquer criança ou adolescente até 18 anos completos), o processo corre em segredo de justiça, ou seja, ninguém poderá ter acesso aos autos daquele processo a não ser as partes interessadas”, garante.
A advogada cita casos em que o crime é cometido por um responsável legal da vítima, informando que ele perde o poder familiar e é afastado da criança e/ou adolescente. Conforme o que seja melhor para a vítima, destaca, ocorrem dois processos: um na esfera civil e outro na esfera criminal.
“Quando ocorre esse tipo de situação, o responsável legal poderá ser destituído do poder familiar, através de uma decisão judicial, no qual também poderá ser afastado do convívio do menor. Em casos em que não houver outro responsável legal ou membro da família que possa acolher a vítima, o Ministério Público irá solicitar ao juízo da Vara da Infância e Juventude o encaminhamento ao serviço de acolhimento institucional”, assegura.
Ana Júlia relata que para ocorrer a destituição do poder familiar e o afastamento do agressor é necessária a realização de uma denúncia formal. Com isso, inicia-se o processo de investigação e o acompanhamento da vítima com atendimento médico, legista e socioassistencial e escuta especializada.
“Caso o agressor não cumpra a medida judicial e insista em se manter perto da vítima, o responsável legal poderá acionar a emergência policial e informar a situação. Após isso, o advogado ou defensor público poderá informar ao juiz competente para que ele possa tomar providências”, alerta.
A assistente social Mônica Tapajós ressalta a importância do acompanhamento de crianças e adolescentes que sofreram abuso e exploração sexual. Criar vínculos de confiança, empatia e propiciar um espaço de escuta adequada e sigilosa são pontos fundamentais para que essas vítimas se sintam confortáveis em relatar os casos sofridos.
"A vítima será encaminhada para procedimento de escuta especializada, provavelmente será submetida a exame sexológico. Dependendo da complexidade da situação, poderá ser encaminhada para acolhimento institucional, dentre outras medidas protetivas previstas no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). A vítima também poderá ser incluída em acompanhamento técnico especializado no Centro de Referência Especializado de Assistência Social - CREAS ou dentro da própria DEACA (Delegacia Especializada no Atendimento à Criança e ao Adolescente)”, diz.
De acordo com Ana Júlia, os crimes de violência sexual contra um menor podem ser:
- Estupro ou estupro de vulnerável;
- Violação sexual mediante fraude;
- Importunação e assédio sexual;
- Corrupção de menores;
- Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente;
- Favorecimento da prostituição ou de qualquer outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável;
- Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia.
Destaca-se que, no Art. 217-A do Código Penal, o termo “vulnerável” é utilizado para definir os que não têm capacidade psicológica ou física para entender e praticar qualquer ato libidinoso (sexual), no caso: menores de 14 anos; pessoas que, por deficiência física ou mental, não podem discernir a prática do ato; e aqueles que, por outras razões, não podem oferecer resistência.
Em casos de suspeita ou confirmação de abuso, exploração ou qualquer crime sexual contra crianças e adolescentes, as denúncias podem ser realizadas nos seguintes canais:
- 100 – Disque Direitos Humanos – ligação gratuita, todos os dias da semana (incluindo sábado, domingo e feriado) e 24h.
- Conselho Tutelar.
- Ministério Público.
- Delegacia.
- Poder Judiciário.
- 191 - Polícia Rodoviária Federal – em casos de tráfico e exploração sexual.
Por Lívia Ximenes e Amanda Martins (sob a supervisão do editor prof. Antonio Carlos Pimentel).