Era para ser uma missão de cinco anos para, "ousadamente, ir aonde nenhum homem jamais esteve", mas, passado meio século de existência, "Star Trek" se tornou um marco que mostrou o que há de melhor na humanidade.
Fenômeno cultural e comercial, adorado por fãs no mundo todo, "Star Trek" (ou "Jornada nas Estrelas", no Brasil) comemora nesta quinta-feira 50 anos tanto na tv e no cinema quanto no imaginário popular, um verdadeiro libelo utópico de uma sociedade livre de ódio e preconceitos.
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Quando a série estreou, em 8 de setembro de 1966, o objetivo era acabar com a visão da ficção científica dos monstros e invasões alienígenas e mostrar uma tripulação heterogênea e harmoniosa se aventurando e uma grande nave estelar, Enterprise, em busca de "novas formas de vida e novas civilizações" em nossa galáxia.
O primeiro episódio, considerado muito cerebral para o público da época, foi rejeitado pela NBC, mas pela primeira vez na história da indústria televisiva americana, foi dada uma segunda chance a uma série.
O segundo piloto, com um novo elenco, cedeu à pressão do estúdio, mostrou mais ação e até um monstro sugador de sal, mas nada disso atrapalhou o que originalmente havia sido concebido pelo criador Gene Roddenberry.
A NBC mal sabia na época a bola de neve que havia começado naquele momento. Ao longo desses 50 anos, foram cinco séries com o mesmo título, totalizando 725 episódios, e 13 longas-metragens, centenas de livros e quadrinhos, e com uma nova série de tv a caminho.
"Falar do aniversário de 50 anos é uma loucura. Eu nasci no mesmo ano que 'Star Trek' nasceu", comenta o diretor e produtor J.J. Abrams, a força criativa por trás do "reboot" dado à série no cinema, quando os personagens principais aparecem em sua juventude, em um universo paralelo.
"Eu sei como me sinto velho, por isso a ideia disso durar tanto é incrível", acrescentou.
A série original foi estrelada por William Shatner, agora com 85 anos, como o corajoso e sedutor capitão James T. Kirk, e Leonard Nimoy, que morreu no ano passado aos 84 anos, como seu oficial de ciências e amigo inseparável, um meio-humano, meio-vulcano dedicado à lógica, sr. Spock.
Completando o trio emblemático estava De Forest Kelley, falecido em 1999, no papel do emocional e adorável dr. Leonard McCoy, o "Magro".
Roddenberry escreveu o piloto em 1965, em pleno período de Guerra Fria e Conquista Espacial, o que ele aproveitou para transformar em temas de discussão em suas histórias.
- Aula de liderança -
Os trekkers, ou fãs de "Star Trek", afirmam que Roddenberry tratou de inúmeros problemas sociais da Terra com uma sensibilidade sem par, ao apresentar pela primeira vez um elenco realmente multirracial (brancos, negros, asiáticos) em convívio harmonioso, pelo menos no espaço.
Entre os marcos da série está o primeiro beijo entre um branco e uma negra transmitido na tv americana.
A série inspirou muita gente a seguir carreira nas ciências e até mesmo no espaço.
"Quando eu era criança, os filmes e séries de tv de ficção científica eram sobre humanos matando - ou sendo mortos - por monstros", afirma o astrônomo Phil Plait, da revista Air and Space, produzida pelo Museu Aéreo Espacial de Washington DC.
"Um episódio da série chamado 'Demônio na Escuridão' mostrando que nem sempre o monstro é o vilão teve um profundo efeito em mim", acrescenta.
O piloto de ônibus espaciais da Nasa, Terry Virtsm, recorda da felicidade que foi ver o primeiro filme de "Star Trek" no cinema com seu pai.
"Nós estudávamos de verdade sobre liderança vendo 'Star Trek' na Academia da Força Aérea. Havia um monte de lições práticas sobre tomar decisões e se arriscar, ou assumir um papel específico para ajudar sua equipe", contou.
Além disso, a série foi responsável por antecipar inúmeros avanços tecnológicos, como o celular, o dvd, o bluetooth, o scanner e o tablet.
O ator americano coreano John Cho, que interpreta a nova versão do piloto Hikaru Sulu na nova trilogia do cinema - incluindo "Star Trek Sem Fronteiras", atualmente em cartaz - defende o multiculturalismo da obra.
"Eu realmente acredito no conceito dos filmes de 'Star Trek'. É um bom produto cultural, na minha opinião. Eu queria ser parte de algo que sentisse ser importante, uma contribuição cultural positiva", declarou o ator de 44 anos à AFP por ocasião do lançamento do mais recente filme.
A franquia atraiu tantos fãs em tantas partes do mundo que hoje a expressão "Trekkers" é a única do tipo listada no renomado dicionário de inglês Oxford.
- Respeito mútuo -
"Star Trek" virou uma fonte inesgotável de referências e homenagens, como "Heróis fora de órbita" (1999), e esta semana estreou nos Estados Unidos a paródia "Unbelievable!!!!!", um longa que é descrito pelos produtores como possivelmente "a maior reunião de ex-atores de 'Star Trek'".
O filme mostra quatro astronautas - um deles uma marionete animatronic parecida com o capitão Kirk - que vão à Lua resgatar seus companheiros perdidos.
Cerca de 28 ex-atores de todas as séries e filmes pisaram no tapete vermelho para ver "Unbelievable!!!!!", incluindo Nichelle Nichols, que interpretou a tenente Uhura na série original, e Walter Koenig, o alferes Pavel Chekov.
"Queríamos criar um filme único e original que os fãs de sci-fi pudessem ver e rever, para celebrar seu amor por essa icônica série de tv", declarou Steven Fawcette, que dirigiu o filme junto com sua esposa Angelique.
Uma nova série, que começa a ser filmada em Toronto esse mês, com estreia marcada para janeiro de 2017, é o novo título de uma franquia que se nega a cair no esquecimento.
A rede CBS anunciou na Comic-Con de San Diego, em julho, o nome da nova série, "Star Trek Discovery."
"Acredito que 'Star Trek' em geral sempre tratou dos direitos humanos e do respeito ao próximo, não importa quem fosse", afirmou o ator Brent Spiner, que interpretou o androide Data em "Star Trek: A nova geração".
"Muitos políticos e cidadãos poderiam aprender com 'Star Trek' e ter um pouco mais de respeito para com seu semelhante", acrescentou.
A nota triste deste ano de comemorações, além do falecimento de Leonard Nimoy - homenageado no novo filme - foi a morte acidental do jovem ator Anton Yelchin, que fazia o novo Chekov no cinema.
Ele morreu esmagado pelo próprio carro em junho desse ano, deixando seus colegas de elenco enlutados e a própria divulgação do filme comprometida pela trágica ocorrência.