A violência mergulhou Quito no caos neste sábado (12). Manifestantes atearam fogo a um prédio público e atacaram veículos de comunicação, o que levou o governo a impor toque de recolher na capital no contexto de um protesto de indígenas contra ajustes econômicos.
O novo dia de manifestações em repúdio às medidas pactuadas com o FMI se degradou rapidamente. Nos arredores da Assembleia Nacional, indígenas ergueram barricadas com troncos e escudos de madeira e enfrentaram com pedras e pirotecnia a Polícia, que respondeu com bombas de gás lacrimogênio.
Grupos de encapuzados atacaram a sede da Controladoria, que ficou envolta em chamas. O presidente Lenín Moreno impôs o toque de recolher e ordenou a militarização desta cidade de 2,7 milhões de habitantes. A medida drástica, que proíbe a circulação em Quito e arredores, começou a vigorar às 15h locais (17h de Brasília). Nenhuma autoridade informou sobre sua vigência.
"Dispus ao Comando Conjunto das Forças Armadas, imediatamente, tomar as medidas e operações que sejam necessárias", destacou o presidente em breve pronunciamento à Nação.
Antes do cair da noite, as forças de segurança ainda se esforçavam para impor a ordem em alguns pontos da cidade, onde grupos de pessoas desafiavam o toque de recolher.
O caos se espalhou no mesmo dia em que o movimento indígena aceitou dialogar com o governo, em busca de uma saída para a crise severa que explodiu há 11 dias.
Moreno acompanha a situação da cidade portuária de Guayaquil, aonde transferiu a sede de governo após decretar o estado de exceção nacional em 3 de outubro e mobilizar as Forças Armadas em uma tentativa de conter o descontentamento social.
Desde então, morreram seis civis e foram registrados 2.100 feridos e detidos, segundo a Defensoria do Povo.
Os protestos também mantêm interrompido o trasporte de petróleo - a maior fonte de divisas - pelo principal oleoduto do país por causa da ocupação de poços na Amazônia.
- "Não deixem que nos matem" -
Amparado no estado de exceção, que a princípio permite restringir alguns direitos por 30 dias, o governo já tinha determinado um toque de recolher ao redor dos edifícios públicos da capital.
As pessoas que esvaziaram pouco a pouco as ruas exigiam o fim da repressão oficial.
"Onde estão as mães e os pais dos policiais? Por que deixam que nos matem?", clamou, chorando, a indígena Nancy Quinyupani.
A imprensa também foi alvo de violência. Manifestantes atacaram as instalações da Teleamazonas e do jornal El Comercio. O canal, que se mantém no ar, retirou 25 funcionários sem reportar nenhuma vítima.
"Por cerca de meia hora, fomos atacados, começaram a apedrejar, forçar as portas e depois a lançar bombas incendiárias", contou no ar Milton Pérez, jornalista e apresentador da Teleamazonas.
O El Comercio, principal jornal de Quito, denunciou no Twitter que sua sede tinha sido atacada "por um grupo de desconhecidos", sem dar maiores detalhes.
O movimento indígena, que lidera o protesto contra os ajustes que encareceram em até 123% o preço dos combustíveis, negou que seus militantes estejam envolvidos nos ataques aos prédios ou à emissora.
- Diálogo incipiente -
"Vamos restabelecer a ordem em todo o Equador", prometeu Moreno após agradecer a decisão dos povos originários de se sentar para dialogar frente à frente, embora não tenha revelado nem quando, nem onde começarão as conversas.
A Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie), que a princípio tinha refutado a oferta, informou ter decidido finalmente "participar" de um encontro com o presidente depois de "um processo de consulta com as comunidades".
No poder desde 2017, o governante enfrenta sua maior crise devido às reforças que acordou com o FMI para aliviar o pesado déficit fiscal que atribui aos gastos excessivos, o endividamento e a corrupção do governo de seu antecessor e ex-aliado Rafael Correa.
Além do fim dos subsídios, as medidas preveem cortar direitos de funcionários públicos. Os indígenas, que representam 25% dos 17,3 milhões de equatorianos, são o setor mais castigado pela pobreza e em sua maioria trabalham no campo.
Com a liberação dos preços dos combustíveis, precisam pagar mais para transportar seus produtos, ao mesmo tempo em que temem uma inflação generalizada.