Tópicos | Jeferson de Freitas

No dia 16 de dezembro deste ano, Jeferson Eduardo de Freitas completa 18 anos. Em um abrigo da Prefeitura do Recife desde os 14, ele se prepara para encarar uma nova fase da vida que poucos jovens da sua idade costumam enfrentar: morar sozinho. "Não estou nervoso, penso em cursar engenharia, arquitetura ou designer, gosto de desenhar", conta, almejando o melhor futuro possível. Jeferson é estagiário do Detran há cinco meses e o salário que recebe está sendo guardado para ajudar nas futuras despesas.

Segundo o Cadastro Nacional de Adoção, existem, em Pernambuco, 214 crianças e adolescentes disponíveis. Assim, como em todo o país, a preferência é pelos menores de três anos. A partir dessa idade, a "adoção tardia", como é chamada, é mais difícil e deixa de lado muitos outros brasileiros. Quanto mais velho, mais difícil ainda ser escolhido. "A maior parte dos casais que adotam é porque não podem ter filhos, por isso querem bebês para acompanhar todas as fases do desenvolvimento. Tem o mito de que se for adolescentes, eles irão pular etapas", conta Luciene Freitas, chefe do setor de acolhimento do abrigo onde Jeferson vive.

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Quando ela percebeu que o garoto não sairia de lá pelo processo de adoção, começaram os preparativos para que ele tivesse as mínimas condições de sustento. O estágio foi o primeiro passo, a procura por um lugar para morar será o próximo. Jeferson até esteve perto de ganhar um lar, através do contato de um tio, porém o processo não andou. "Eu tinha conversado com ele que só iria com a minha irmã, mas ele não quis levar ela, disse que daria muito trabalho", conta. A menina, que mora no mesmo abrigo, tem nove anos e é autista.

Os municípios disponibilizam o Aluguel Social, programa com verba do Governo Federal para pessoas de baixa renda. No Recife, o valor é de R$ 200, mas Jeferson só poderá dar entrada no benefício quando completar 18 anos. Outra opção de assistência são os abrigos municipais, porém a independência é sempre o melhor caminho. "Para um jovem que passou a vida rodeado de outros adolescentes e crianças, é complicado se relacionar com adultos desconhecidos assim do nada", explica Luciene.

A voz da experiência 

Josivaldo da Silva Medeiros, hoje com 19 anos, viveu o mesmo caso em 2016. Ele também completou a maioridade em um abrigo. Foi mais um que contou com alguém para lhe ajudar na transição. Micheline Sales, gerente da casa de acolhimento onde o jovem estava, fez uma feijoada para arrecadar dinheiro e lhe matriculou em um curso profissionalizante. "Quando uma pessoa quer ter um filho, é como se ela quisesse uma folha em branco para preencher", diz Micheline, explicando a dificuldade que é a adoção tardia.

 

Hoje casado e empregado graças à capacitação que fez quando ainda era de menor, Josivaldo tem muitas histórias para contar e algumas ilustram a dificuldade de conseguir um lar adotivo. Ele fugiu de casa, no bairro dos Coelhos, Centro do Recife, aos 7 anos, porque o pai bebia e batia nele e nas duas irmãs mais novas. A mãe não reagia. A saída foi deixar todos para trás. Não viu nenhum deles até hoje, nem as garotas.

Entre um abrigo e outro, o tempo foi passando. Através do Cadastro Nacional de Adoção, surgiu a primeira chance de uma nova família. A esperança, porém, esbarrou no racismo. "A mulher que queria me adotar pediu uma foto. Pouco tempo depois, o juíz me chamou e disse que os parentes dela não tinham gostado porque eu era preto", conta. Ele tinha 10 anos de idade e essa foi a primeira decepção.

A segunda foi mais traumática. Josivaldo chegou a passar um anos e seis meses com um casal, mas a realidade foi dura mais uma vez. "Eles (os pais adotivos) queriam que eu tomasse conta dos filhos mais novos e que trabalhasse no negócio deles. Eu não me sentia parte da família, não era tratado da mesma forma. Pedi para voltar ao abrigo e eles me devolveram. Depois disso, desisti. Era melhor não arriscar a passar de novo por essa situação", relembra. 

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O vínculo com o antigo lar não foi perdido. Josivaldo ainda visita o abrigo, conversa com os velhos colegas, passa para eles sua experiência e mantém a amizade com Micheline, a quem chama de "segunda mãe". O mesmo sentimento de não perder o contato com o passado tem Jeferson, principalmente pela irmã que ainda ficará por lá. "No futuro, vou levar ela para morar comigo. Prefiro até do que ela ser adotada", revela.

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