A história do capuchinho que evangelizou o Nordeste brasileiro e que agora é venerável virou documentário. A première do longa Frei Damião - O Santo do Nordeste, intitulado Hors Concours, acontecerá nesta segunda-feira (29), na abertura do festival Cine PE, no Cinema São Luiz, no Recife. O filme foi produzido pela Fábrica Estúdios, com roteiro de Nadezhda Bezerra e direção da cineasta pernambucana Deby Brennand.
A narrativa do filme segue uma linha cronológica e biográfica dos 98 anos de vida do Frei Damião. Por isso, remonta sua história, a partir da ficção, mesclando imagens inéditas captadas pelos cineastas Otacílio Cartaxo e Machado Bitencourt, já falecidos, da década de 60, e filmagens gravadas em fitas VHS durante os anos 70 até a morte do Frei, em 1997, que foram guardadas no Convento de São Félix, no Pina, Recife.
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“A Fábrica Estúdios estava desenvolvendo a série Caçadores de Milagres e um dos episódios era sobre um milagre de Frei Damião. Foi aí que a gente percebeu que precisava descobrir mais sobre isso”, conta Pablo Lopes, produtor e produtor executivo do longa. Ele entrou em contato com Jairo Chaves, também produtor executivo do filme, que já tinha contato com os capuchinhos, e, juntos, foram até o Convento de São Félix, uma das bases capuchinhas no Recife. Aos poucos, Pablo passou a conhecer mais a história - e as pessoas que representavam a imagem de Frei Damião.
Com a visita ao convento e a descoberta das filmagens em VHS, a produtora audiovisual, ao digitalizar o material, percebeu o valor do personagem e da sua história, e, assim, ficou interessada em produzir o filme. A criação do roteiro e captação de recursos para o longa começou no final de 2016, finalizando, com a pós-produção, em 2018.
As gravações começaram na Itália, em março de 2018, onde Frei Damião passou sua infância e adolescência. Como relatam os familiares e biógrafos, ele recebeu um chamado de Deus, quando ainda era Pio Gianotti, aos 13 anos. No dia da sua primeira comunhão, ele sumiu e foi encontrado no sótão de casa, rezando, em transe. A partir deste acontecimento, sua vida mudou. Ele deixou de ser um simples garoto para se tornar o Frei Damião. Como os capuchinhos, que iam para lugares muito precários para catequizar, ele decidiu ir ao Brasil, largando tudo. Desde o dia em que desembarcou no país, em 1930, até o dia em que faleceu, não interrompeu suas santas missões, que tinham como objetivo proclamar a palavra de Deus, voltando poucas vezes à Itália.
Foi ao Nordeste que o religioso dedicou a sua vida. Durante 66 anos, percorreu estados como Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Bahia e Ceará nas Santas Missões. Como passou boa parte de sua vida nessa região, diversas cenas da película foram captadas em estados como Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba, que, na pesquisa de pré-produção do filme, foram apontados como pontos em que o religioso marcou diversos fiéis com sua devoção, sensibilidade e fé.
Na zona rural de Pernambuco, uma dos episódios impactantes foi em relação à sensitividade do frei. “Ele é famoso por ser sensitivo, então, ele previa as coisas. No filme, a gente recria um milagre a partir de uma entrevista a uma testemunha que estava com ele durante o acontecimento”, conta Pablo Lopes. Segundo o depoimento, o religioso afirmou que pessoas iriam aparecer querendo falar com ele na estrada, e ninguém acreditou. Horas depois, surgiram dois homens pedindo ajuda para um parto, que, segundo o frei, foi realizado pelas mãos de Maria, a mãe de Jesus.
A pé, a cavalo ou de carro, Frei Damião andou mais de um milhão de quilômetros. Não é à toa que ele ficou conhecido como mensageiro de Deus. “Ele levava não somente a palavra de Deus, mas representava também um grito pelos excluídos, pelos nordestinos e pela condição de pobreza que encontrava em suas andanças”, ressaltou Jairo Chaves, produtor executivo do filme.
O objetivo do longa, através das imagens inéditas, entrevistas, depoimentos, testemunhos de milagres e reinterpretação de acontecimentos, mostrar um ser humano que está acima da religião. Frei Damião ia além. Para Jairo Chaves, o capuchinho não se limita a um ícone religioso, apesar de ter sido um dos maiores missionários que percorreram o Brasil. “Ele é um ícone da cultura nordestina, dos nosso valores”. Pablo Lopes compartilha da mesma visão. “O filme é sobre uma pessoa, que é muito forte dentro de uma religião, mas que é algo muito mais de fé, sensação e sensibilidade”, comenta. O documentário não foca apenas nos seus adoradores, mas se preocupa em mostrar o legado do capuchinho também para aqueles que não o conhecem e desejam entender o significado dele para uma legião de fiéis.
O documentário, que contou com o incentivo da Ancine, teve patrocínio do Café Santa Clara, da Petrovia, da CHESF, do BNB, da Kicaldo,da Atiaia Energia e da Loja do Condomínio.
Cine PE
Para Pablo Lopes, produtor executivo do longa, é uma honra que a première do documentário ocorra em um festival como o Cine PE. Segundo ele, o evento é uma jóia dos festivais brasileiros e é conhecido por ter um dos maiores públicos de festival do Brasil. Além disso, o São Luiz trata-se de um cinema histórico, em um local clássico da cidade, no bairro da Boa Vista.
“Quando a gente inscreveu o filme, lá atrás, a gente estava com uma super expectativa. Como em qualquer instituição de festival que você participa, pode acontecer de você simplesmente não ser selecionado. Quando a gente teve a notícia que fomos selecionados para Hors Concours, foi muito especial”, comenta Pablo Lopes, produtor do documentário.
O local da première do filme Frei Damião - O Santo do Nordeste não poderia ser diferente. Toda a história do capuchinho está atrelada ao Nordeste, como sugere o título do longa, principalmente o Recife, onde fica o Convento de São Félix, no Pina, e a Basílica da Penha, em Santo Antônio, bases capuchinhas. O evento vai reunir boa parte da equipe que participou da produção, no Recife, como forma de confraternização entre todos os envolvidos no projeto. Pessoas importantes, como o médico que cuidou do frei até seu falecimento, poderão estar presentes na abertura do festival. “Aqui é o lugar que a gente pode convidar pessoalmente e levar todas essas pessoas para o cinema”, diz Pablo.
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Beatificação e canonização
O processo de beatificação e canonização do Frei Damião foi aberto em 2003. No último mês de abril, uma decisão do Papa Francisco deixou o Frei Damião mais perto da beatificação. Um decreto do sumo pontífice, editado no Vaticano, reconheceu como venerável o frade capuchinho, que nasceu na Itália e morreu no Recife. Para que ele seja declarado beato, falta a comprovação de um milagre.
Apesar de Frei Damião não ser oficialmente santo, o sentimento dos fiéis é diferente. Estima-se que o capuchinho seja autor de mais de 30 mil milagres ao longo de sua vida. “Para os fiéis, ele é um santo. É aquele homem de Deus por meio de quem as pessoas recebem Graças, lembram dos conselhos e orientações. Muita gente ainda pauta a vida e o dia a dia lembrando dos ensinamentos dele”, comentou Frei Jociel Santos, postulador da causa de beatificação e canonização do frei.
Na visão pessoal do Frei Jociel, que também foi consultor de conteúdo da produção audiovisual, Frei Damião foi alguém que dedicou praticamente sua vida inteira a um ideal. No caso do capuchinho, um ideal religioso, de vida consagrada, de evangelização e pregação da palavra de Deus. “Ele enfrentou todas as dificuldades e desafios, nunca desistia. Perseverou até o fim no que acreditava”.
Com informações da assessoria