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Sem dono. O Cemitério dos Ingleses - patrimônio histórico de Pernambuco desde 1984 e primeira necrópole inaugurada no Recife - parece ter sido esquecido por quem deveria preservá-lo. Após reportagem publicada pelo Portal LeiaJá, o Consulado Britânico emitiu uma nota oficial e negou a responsabilidade pelo local, indo de encontro à informação da Sociedade Administradora do cemitério de que o terreno é propriedade do Reino Unido.

"O Consulado Britânico em Recife não tem qualquer responsabilidade sobre a manutenção ou administração do Cemitério dos Ingleses, conforme reportado em matéria veículada no dia 20 de setembro de 2016", diz o texto. A assessoria do Consulado ainda desmentiu o administrador do cemitério, Esmeraldo Marinho, ao afirmar que não houve quaisquer reuniões realizadas entre funcionários a serviço do Governo Britânico e os sócios do British Cemetery. 

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Através da Gerência de Necrópoles, a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb) é responsável por serviços básicos nos cemitérios públicos da capital. A reportagem entrou em contato para confirmar o que já previa: o órgão, também, não tem obrigação com o Cemitério dos Ingleses. São atendidos pela Emlurb os cemitérios de Santo Amaro, Parque das Flores, Tejipió, Várzea e Casa Amarela.

Governo do Estado rebate: cemitério é propriedade do Consulado

A Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) averiguou em seus registros, nesta sexta-feira (30), a situação do Cemitério dos Ingleses do Recife. Através de sua equipe de imprensa, confirmou que o local é propriedade do Consulado Britânico e a Sociedade (formada por parentes de pessoas lá enterradas) funciona apenas como mantenedora, através de doações.

O papel da Fundarpe, de acordo com a própria, é oferecer profissionais para dar consultorias que auxiliem na preservação do local. Como informado na reportagem anterior do Portal LeiaJá, a Fundação cita o projeto para requalificação do local, inscrito no Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura) e em processo de avaliação. 

Um pedaço da história imperial do Brasil desprezado pelo poder público. Tombado como patrimônio de Pernambuco em 1984, o Cemitério dos Ingleses - a primeira necrópole do Recife, datada de 1814 - padece com a falta de investimentos. Localizado no coração do Recife, entre as avenidas Norte e Cruz Cabugá, no bairro de Santo Amaro, o espaço sobrevive às custas de doações dos associados, suficientes apenas para reparos básicos. 

Administrador do local há 22 anos, Esmeraldo Marinho explica que o terreno pertence ao Consulado Britânico, porém o órgão não se responsabiliza com a manutenção. "O Consulado abandonou. Já fiz repetidas reuniões, eles indicam empresas que poderiam ajudar (financeiramente), mas nada sai do papel. Nos mantemos aos trancos e barrancos". A reportagem entrou em contato com o Consulado Britânico e, até a publicação da matéria, não recebeu nenhum posicionamento sobre a situação.

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Ferrugem, rachaduras, túmulos cobertos pelo mato. O valor arrecadado pelas doações dos membros da Sociedade Administradora do Cemitério dos Ingleses não cobre todas as despesas necessárias para manter o local como se deve. "Dos 200 membros, cerca de 80 pagam a mensalidade de R$ 120. Só nos túmulos de parede, gastei R$ 15 mil ano passado, porque o gesso da parte de cima estava afundando. A gente faz o que pode, né?", lamenta Esmeraldo Marinho. 

Casos de invasões e furtos de objetos se tornaram comuns no cemitério. "Quando eu era menino, tinham vasos em cima dos túmulos que valiam uma fortuna. Roubaram todos. Os vândalos subiam aí direto, quebravam tudo, já levaram escada, carro de mão, até a fiação elétrica", testemunhou Luiz Augusto Vieiro, que morou em frente ao cemitério por vários anos e hoje tem um comércio no local. Na tentativa de coibir práticas criminosas, três câmeras de segurança e cercas elétricas foram instaladas ao longo do terreno.

Um projeto para restaurar o local foi inscrito no Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura) e segue no processo de aprovação. Para o consultor aposentado Richard Conolly, descendente de irlandeses cujos familiares estão enterrados no Cemitério dos Ingleses, o projeto deve buscar retomar a identidade do espaço. "Gradativamente, a estrutura do cemitério foi alterada. A capela, a parte da frente que antes não tinha muro (só grades). É necessário colocar em ordem, sair do estado de abandono". Apesar de sempre parecer fechado, o Cemitério dos Ingleses é aberto ao público e continua a fazer sepultamentos. 

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História

Originalmente denominado de British Cemetery, o cemitério foi doado no século XIX por Dom João VI ao Cônsul Inglês, após o decreto da Abertura dos Portos às Nações Amigas. Um dos artigos do tratado versava justamente sobre a designação de lugares para o sepultamento de cidadãos britânicos que morressem em outros países. No Brasil, a Igreja Católica desautorizava o enterro dos não-católicos em seus templos e os súditos britânicos eram sepultados nas praias e nas campinas. Além do Recife, foram construídos cemitérios ingleses em Natal, Salvador e Rio de Janeiro. 

Mas não só cidadãos da Grã-Bretanha estão enterrados no Cemitério dos Ingleses do Recife. A lápide do General Abreu e Lima é a mais famosa do local: por ser maçom, o militar não pôde ser enterrado no Cemitério de Santo Amaro e foi sepultado no dos Ingleses, em 1869. Apesar de pertencer ao Consulado Britânico, pessoas de quaisquer nacionalidades podem ser enterradas no local. Atualmente, um jazigo no Cemitério dos Ingleses custa cerca de R$ 2 mil. Neste ano de 2016, oito sepultamentos foram realizados no local.

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Um patrimônio fundado em 1814, o Cemitério dos Ingleses se encontra em total abandono. Apesar de ser 100% particular, uma placa colocada logo na entrada cemitério, localizado na Avenida Cruz Cabugá, Zona Norte do Recife, informa que o local é tombado como patrimônio do Governo do Estado, desde 1984. O patrimônio tem valor histórico, cultural, tendo o direito de ser preservado.

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Zeladora há mais de 20 anos do local, Maria José Pereira da Silva, afirma que os mortos são enterrados pelos parentes e, depois disso, ninguém aparece mais. “Ninguém mais paga isso aqui. Há rachaduras, esquecimento, abandono. A manutenção não é feita pelos parentes aqui. Se você for olhar, tem cupim, parede rachada, tudo maltratado”, afirma Maria José.

De acordo com o administrador do local, Esmeraldo Marinho, a estrutura onde seria para funcionar a capela estava com problemas e uma faixa foi colocada para pedir ajuda. “Agora, estamos pedindo até esmola. Tivemos que arranjar não sei de onde dinheiro para reformar essa estrutura, pois a Prefeitura do Recife olhou e disse que comprometeu o lugar, por isso, foi feita a medida urgente”, relata.

Ainda segundo ele, o custo mensal do cemitério chega a R$ 3 mil e, como patrimônio há muitos anos, deveria ter uma atenção especial do Governo. “A gente fica no escuro, sem nada. A única ajuda que recebemos é dos poucos parentes que pagam a manutenção. Ninguém se prontifica a ajudar em nada”, lamenta. Até o fechamento desta matéria, a reportagem do LeiaJá não conseguiu falar com a assessoria do Governo do Estado.

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