Peluso repudia críticas e nega crise no Judiciário
Depois de um mês de críticas ao Judiciário, suspeitas de corporativismo e pressão sobre magistrados e de dúvidas sobre os poderes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, quebrou o silêncio e repudiou as críticas e afirmações de que o Judiciário estaria em crise. No discurso de 38 minutos na abertura dos trabalhos do STF, Peluso admitiu que a magistratura não é invulnerável à corrupção, mas afirmou que o Judiciário é o poder que mais se fiscaliza, repeliu pressões sobre os ministros e enfatizou que os juízes continuarão a cumprir sua função com independência.
Peluso classificou como "impróprias" e "tendentes a constranger juízes e ministros" as pressões exercidas contra magistrados. No discurso, o presidente afirmou que opiniões distintas sobre o mesmo assunto são parte da "vida republicana", mas criticou, sem identificar os alvos, pressões externas sobre magistrados como forma de levar os ministros a votar contrariamente às suas convicções. "Pressões, todavia, são manifestação de autoritarismo e desrespeito à convivência democrática", disse.
As declarações não fizeram referência direta, mas lembraram as acusações contra ministros do STF que concederam liminares para limitar os poderes do CNJ. No final do ano passado, Marco Aurélio Mello concedeu liminar para dizer que o CNJ só poderia processar magistrados depois que as corregedorias dos tribunais locais processassem esses juízes.
No mesmo dia, o ministro Ricardo Lewandowski suspendeu as inspeções que seriam feitas pela Corregedoria Nacional de Justiça em 22 tribunais, analisando declarações de bens e rendas dos magistrados e servidores e valendo-se de dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e das folhas de pagamento dos tribunais. Os dois foram alvos de críticas. Lewandowski foi acusado de dar a liminar por ter recebido verbas atrasadas do Tribunal de Justiça de São Paulo, o primeiro a ser inspecionado.
Desde então, o Judiciário foi alvo de críticas. Apesar disso, Peluso afirmou não haver crise. "Temos ouvido, com surpresa, que o Poder Judiciário está em crise. Os mais alarmistas não excepcionam sequer os outros dois Poderes da República. Confesso que, alheio ao hábito da só visão catastrófica dos homens e das coisas, não é assim que percebo o País, nem o Poder Judiciário", afirmou.
Peluso disse que estimular ou tentar levar o Judiciário para uma crise de legitimidade seria suicídio. "Só uma nação suicida ingressaria voluntariamente em um processo de degradação do Poder Judiciário. Esse caminho nefasto, sequer imaginável na realidade brasileira, conduziria a uma situação inconcebível de quebra da autoridade ética e jurídica das decisões judiciais que, aniquilando a segurança jurídica, incentivando violência contra os juízes e exacerbando a conflitualidade social em grau insuportável, significaria retorno à massa informe da barbárie. Não é esse o nosso destino", enfatizou.
Controle
Ao contrário das suspeitas de corporativismo e de tentativa de esvaziamento do poder de fiscalização de CNJ, Peluso afirmou que o Judiciário é, dos três poderes, aquele com estrutura mais rigorosa para punir seus integrantes, inclusive com a participação de representações de fora do Judiciário. Nem a Controladoria-Geral da União (CGU), que faz o controle administrativo do Executivo, nem as corregedorias da Câmara e do Senado teriam tantos poderes correcionais quanto o órgão de controle do Judiciário.
"Nenhum dos Poderes da República se reveste do portentoso aparato
de controle que (...) cerca o Judiciário mediante as corregedorias locais e dos tribunais superiores e do Conselho Nacional de Justiça, que é, à margem do contexto teórico do equilíbrio constitucional, o único órgão integrado por agentes externos a exercer contínua e rigorosa fiscalização do próprio Poder", disse.
Peluso reconheceu que o Judiciário não está isento de vícios e afirmou que o juiz não é "invulnerável à corrupção", mas disse que esses problemas atingem a sociedade como um todo. "Esta, a corrupção, não é objeto de geração espontânea, nem o resultado de forças estranhas à dinâmica social, senão que é produto mesmo das sociedades cuja cultura está em privilegiar, como objetivo primordial da vida, a conquista e o acúmulo, por qualquer método, de bens materiais, em dano do cultivo dos valores da ética e da decência pública e privada", disse.
Ainda no discurso e horas antes de iniciado o julgamento das competências do CNJ, Peluso tentou tirar a paixão do debate sobre os poderes do Conselho. Algo que já era defendido por outros ministros às vésperas do julgamento de ontem. Peluso afirmou que não se discute se magistrados suspeitos de corrupção devem ou não ser punidos.
"No debate apaixonado em que se converteu questão jurídica submetida ao juízo desta Corte, acerca do alcance e limites das competências constitucionais do CNJ, perde-se de vista que seu âmago não está em discutir a necessidade de punição de abusos, mas apenas em saber que órgão ou órgãos deve puni-los. Entre uma e outra coisas vai uma distância considerável", afirmou.