Militar da Funai promete 'meter fogo' em índios isolados
O tenente Henry Charlles encorajou líderes do povo marubo a disparar contra indígenas isolados, considerando conflitos entre as diferentes etnias
O tenente da reserva do Exército e coordenador da Funai no Vale do Javari, Henry Charlles Lima da Silva, encorajou líderes do povo marubo a abrir fogo contra indígenas isolados no Amazonas, caso sejam “importunados”.
A declaração, referente a uma reunião no dia 23 de junho, foi capturada em áudio e divulgada nesta quinta-feira (22) pelo jornal Folha de S. Paulo, que comprovou a autenticidade da mensagem de voz.
Dias antes, indígenas isolados raptaram uma mulher de 37 anos da aldeia, segundo relatos dos marubos. A mulher foi encontrada, mas já havia sido vítima de outros dois sequestros desde 2020.
“Eu vou entrar em contato com o pessoal da Frente [de Proteção Etnoambiental] e pressionar: ‘Vocês têm de cuidar dos índios isolados, porque senão eu vou, junto com os marubos, meter fogo nos isolados. São eles que estão saindo do território deles para importunar os marubos”, disse Henry, durante reunião na aldeia Paulinho, no mês passado.
O surgimento dos isolados nessa região do rio Ituí está sendo investigado pela Frente de Proteção Etnoambiental Vale do Javari, que não é subordinada à Coordenação Regional, responsável apenas pelas populações indígenas contatadas.
“Não estou aqui pra desarmar ninguém, também não estou aqui pra ser falso e levantar bandeira de paz. Eu passei muito tempo da minha vida evitando a guerra, mas se a guerra vier, nós também não vamos correr. Se vierem na terra de vocês, vocês têm todo o direito de se defender. Se eles [os isolados] cometerem algum delito, alguma ameaça a vocês, a gente tem de ver o que pode fazer pra poder parar”, afirmou o coordenador. E continuou: “eles já entendem. Já pedem cesta básica, já falam português, já têm contato direto com a frente, não se justificam certas atitudes deles”.
No entanto, segundo informações de arquivo da própria Funai, não há registros de falantes de português entre os povos isolados mencionados, tampouco eles são contemplados pelos programas de segurança alimentar.
"A gente tem de tomar uma providência para evitar um mal maior. Eu não tiro o direito de vocês, independentemente da lei penal ou não, de defender o seu território, a sua maloca, a sua casa, o seu povo, a sua mulher, as suas crianças”, prosseguiu.
Ao final do áudio, Henry diz que o governo Jair Bolsonaro (sem partido) não consegue atuar na área indígena “por questões ideológicas”: “A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) vai, denuncia, e a gente fica nesse impasse”.