OMS alerta que pandemia supera ficção científica
Na Índia, o avanço dos contágios é vertiginoso: um milhão de novos casos em apenas 11 dias, mas os números reais podem ser muito maiores
Os contágios do novo coronavírus aumentam em ritmo vertiginoso na Índia e o segundo país mais populoso do mundo superou nesta quarta-feira (16) a marca de cinco milhões de casos, no momento em que a OMS traça uma panorama pouco optimista sobre a evolução da pandemia e alerta para a situação difícil na Europa.
"Isto é pior que qualquer ficção científica sobre pandemias", afirmou na terça-feira no Parlamento britânico o doutor David Nabarro, um dos seis enviados especiais da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a Covid-19.
"É realmente sério, não estamos nem na metade do caminho, estamos no início", completou, de acordo com agência britânica Press Association.
Na Índia, o avanço dos contágios é vertiginoso: um milhão de novos casos em apenas 11 dias, mas os números reais podem ser muito maiores. O país, com população de 1,3 bilhão de pessoas, é o segundo do mundo com o maior número de casos, atrás apenas dos Estados Unidos, que registram mais de 6,5 milhões de contágios.
O número total de mortes por coronavírus no país asiático superou nesta quarta-feira 82.000, menos da metade dos 195.000 óbitos registrados nos Estados Unidos, mas há vítimas fatais da covid-19 que nunca serão incluídas nas estatísticas indianas, alertam os analistas.
O novo coronavírus já matou quase 930.000 pessoas no planeta, de acordo com um balanço da AFP com base em números oficiais dos países. América Latina e Caribe, a região mais afetada, registram 312.071 mortes e mais de 8,3 milhões de contágios.
A pandemia provoca cenas inéditas, como o atípico e solitário grito de independência do México protagonizado na terça-feira pelo presidente Andrés Manuel López Obrador. O ato central da festa pátria, que normalmente concentra milhares de pessoas na praça pública mais importante do país, Zócalo da Cidade do México, aconteceu sem a presença da população e com um minuto de silêncio em memória das vítimas do coronavírus.
- Europa deve tomar decisões -
Na Europa, a situação piora: na sexta-feira passada, a OMS registrou no continente 53.873 novos casos em um dia, um recorde.
O diretor de emergências da OMS, Michael Ryan, disse que é hora de tomar decisões difíceis para proteger os mais vulneráveis e manter as aulas dos mais jovens.
"A Europa vive aquele momento em que começa uma estação em que as pessoas voltarão a estar em locais fechados (...) Como podemos manter esses dois princípios: proteger os vulneráveis da morte e levar nossos filhos de volta à escola?" questionou.
"O que é mais importante: que os nossos filhos voltem às aulas ou que os bares e discotecas estejam abertos?", questionou Ryan.
A França fechou mais de 80 escolas desde o retorno do ano letivo há 15 dias pela detecção de casos de coronavírus, anunciou o ministro da Educação, Jean-Michel Blanquer.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, fez um apelo nesta quarta-feira aos países do bloco pela construção de uma "União Europeia (UE) da saúde" ante a pandemia de covid-19, que evidenciou a necessidade de uma cooperação mais estreita e de uma harmonização da maneira de administrar emergências.
Nos Estados Unidos, a pandemia ganha um tom cada vez mais político. No país com o maior número de mortes do mundo, cientistas denunciam uma pressão "sem precedentes" sobre as instituições de saúde pública por parte do presidente Donald Trump, envolvido na campanha para tentar a reeleição em novembro.
"Interferir assim no funcionamento científico das agências não tem precedentes", declarou à AFP William Schaffner, membro do conselho editorial do boletim dos Centros para a Prevenção e Controle de Doenças (CDC), uma publicação fundamental para as autoridades da saúde pública.
A comunidade científica e a oposição democrata criticam o esforço de Trump para obter o anúncio precipitado de uma vacina antes das eleições de novembro.
Na terça-feira à noite, o presidente afirmou que a vacina poderia estar pronta em "três semanas, quatro semanas", uma previsão extremamente otimista.
- Mais pobres, mais desnutridos -
As consequências econômicas da pandemia não param, uma sucessão permanente de notícias ruins.
"É uma situação terrível, um problema de saúde que está fora de controle e que afunda o mundo não apenas na recessão, mas em uma contração econômica gigantesca que vai dobrar o número de pobres, de desnutridos, levar milhões de pequenas empresas à falência", disse Nabarro, da OMS.
De acordo com a Organização Mundial do Turismo (OMT), uma agência da ONU, o setor perdeu 460 bilhões de dólares de faturamento no primeiro semestre devido à pandemia.
Nesta quarta-feira, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) afirmou que a recessão mundial será de 4,5% este ano, menos severa que o previsto, graças à reação rápida e consequente dos Estados, mas que a recuperação em 2021 será menos intensa que mostravam as previsões anteriores e ficará por volta de 5%.
A pandemia também provoca diferenças entre classes sociais e raças. Um estudo publicado esta semana nos Estados Unidos pelos CDC mostra que as crianças, adolescentes e adultos jovens de minorias hispânicas, negras e indígenas são proporcionalmente muito mais vulneráveis à covid-19 que as pessoas brancas.
Dos 121 mortos pelo coronavírus menores de 21 anos nos Estados Unidos entre fevereiro e julho, 45% eram hispânicos, 29% negros e 4% indígenas ou nativos do Alasca.