Diabolin: artista de rua, pai e um exemplo de vida

Com uma coragem sem tamanho, Gilberto do Nascimento Ferreira, também conhecido como Diabolin, cria sozinho as duas filhas e um filho com o dinheiro conquistado na sua arte

por Nicole Simões dom, 13/08/2017 - 13:36

Na contramão das histórias, em que a maioria dos filhos ficam sob a guarda das mães quando os casais se separam, alguns pais acabam decidindo estar mais perto da criação e assumem a responsabilidade de educar os pequenos. Seja por falta de escolhas ou por opção, os homens estão se tornando cada vez mais presentes na criação dos filhos.  

Exemplos como o de seu Gilberto, 49, demonstram o quanto alguns deles se sacrificam e fazem de tudo para trazer o pão para dentro de casa. Pequeno, franzino, mas com uma coragem sem tamanho, Gilberto do Nascimento Ferreira, também conhecido como Diabolin, é um personagem famoso nas ladeiras históricas de Olinda. Não só pela profissão que escolheu, mas por mostrar que um homem é capaz de educar os filhos sozinho e cuidar deles.  

Aos 9 anos de idade, Diabolin decidiu sair de casa para cuidar da mãe, deixou o seu pai, largou os estudos e foi trabalhar na rua como camelô. Vendeu remédio, cobra, pomada, lagarto, rodou o Nordeste e conheceu praticamente todo o interior de Pernambuco. Fazendo equilibrismo, engolindo fogo e praticando malabarismo, aos 10 anos de idade ele já se apresentava no mercado São José, no centro do Recife.  

"Já sai de casa fazendo show. Para ser uma artista, como se diz, você tem que conhecer o mundo", revela Gilberto. Com uma mochila nas costas, aos 17 anos ele foi morar no Rio de Janeiro, onde ficou por um tempo e depois mudou-se para São Paulo. Sem saber ler, muito menos escrever, Gilberto recebeu o nome artístico dos amigos. "Onde a galera me chamava, eu ia. Botava a mochila nas costas e saia de cidade a fora. Dormia aqui, dormia ali, mas era a forma que tinha e que eu sabia ganhar a vida", conta o artista. 

De volta a Pernambuco, em 1994, Diabolin fixou moradia em Olinda, cidade onde nasceu, por três bons e agitados motivos: Wesley, Cleonice e Letícia. Separado da mulher, ele ficou com os filhos para criar. "Teve um tempo que não deu mais, estava muito difícil conviver com a mãe deles e aí nos separamos. No começo, eu achei que íamos dividir a guarda dos meninos, mas ela foi embora e me deixou com os três para criar sozinho. Minha maior dificuldade foi aprender a me virar com eles, as minhas irmãs ainda me ajudaram com os três, mas ainda assim, eu tive que abandonar minhas viagens e ficar por aqui para poder cuidar de cada um", relembra Gilberto. 

Diabolin aprendeu cedo o que é ser pai e enfrenta desafios todos os dias para manter os três filhos. Em entrevista exclusiva ao LeiaJá, o artista revelou um pouco da sua vida. Confira: 

Por conta do trabalho, hoje realizado todos os sábados e domingos na pracinha de Boa Viagem, Zona Sul do Recife, mais uma vez Diabolin precisou largar os estudos para se dedicar a família. Ele conta que durante o dia aproveita o tempo para fazer o almoço, cuidar da casa, levar os filhos para escola e fazer outras atividades manuais, como por exemplo, a pintura.  

"Eu sou um cara doido do mundo, eu andei por todo canto e agradeço a Deus por ter tido essa oportunidade. Fui um doido do mundo e estou aqui até hoje. Foi da rua que alimentei minha mãe e hoje sustento os meus três filhos. Wesley é o mais velho, com 14 anos. Letícia tem 13 e Cleonice tem 12 anos", diz Gilberto. 

Para ele, os artistas vêm das praças, não de dentro do circo. "Por onde você anda, em alguns lugares hoje, você vai ver vários artistas bons nas ruas, as pessoas precisam dar valor a arte de cada um. Somos artistas e a maioria tem alguém em casa pra dar de comer", desabafa.  

Perto de fazer 50 anos, todo o esforço do artista é para ver os filhos amanhã com um futuro digno. Gilberto quer deixar de herança os segredos do ofício. "Eu não posso obrigar eles a trabalharem comigo hoje, além de serem menores de idade, eu prefiro que eles estudem. Se um dia eles quiserem ser artista como eu vai ser um orgulho. Mas a escolha é deles", explica Diabolin. 

O pai de Wesley, Letícia e Cleonice nunca teve carteira de trabalho assinada, não tem plano de saúde, nem seguro de vida. Mesmo assim ele dá expediente a mais de três metros do chão. Uma atividade de alto risco, porque ele não usa nenhum equipamento de segurança.  

Segundo as meninas, o pai não deixa nada faltar e faz tudo que pode para manter os filhos estudando sem precisar trabalhar. As filhas reconhecem todo o esforço e dedicação do seu Gilberto. Cleonice e Letícia falam em entrevista ao LeiaJá sobre a cobrança do pai para que elas tenham um futuro melhor. Veja: 

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Solteiro até hoje, ele espera um dia voltar a estudar e concluir o ensino médio e até quem sabe se apaixonar novamente. Por enquanto, o artista de 49 anos continua se apresentando todos os fins de semana, de chuva a sol, em cima de uma corda.  Com talento e coragem, o destemido Diabolin segue levando a vida por um fio, se equilibrando na corda bamba, cumprindo o que pra ele é uma missão. "A vida do artista só acaba quando ele morre, e ainda sim, eu quero que as pessoas lembrem-se de mim e do meu trabalho", finaliza.

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