Companhia de Marcos Damaceno apresenta peças em SP
Todos os anos, o Fringe - mostra paralela do Festival de Curitiba - propõe um mar de opções para quem quer se aventurar. O espírito do evento, afinal, é este: qualquer espetáculo pode participar. Só este ano, são mais de 300 títulos na programação. Nesse cenário, há espaço para surpresas. Mas, para quem busca certa segurança na hora de escolher, já se tornou tradição procurar, em meio à grade caótica, pelas produções do diretor Marcos Damaceno e de sua companhia.
Ao lado da atriz Rosana Stavis, o encenador e dramaturgo criou um dos grupos mais sólidos e inventivos do Paraná. Um trabalho que, na atual edição do Fringe, pode ser conferido em duas criações: Árvores Abatidas - Ou Para Luís Melo e Espasmo. Ambas, com temporadas marcadas em São Paulo.
Árvores Abatidas fez sua estreia em 2008. Rodou o País, conquistou o reconhecimento da crítica e chega ao Espaço Cultural da Caixa, na Sé, na quinta-feira. Já Espasmo é a mais recente criação do grupo. Teve pré-estreia nacional durante o Festival e entra em cartaz no dia 2 de maio, no Sesc Consolação.
Escrita pela jornalista e dramaturga Gabriela Mellão, a peça se insere no contexto da pesquisa de Damaceno: a busca por uma dramaturgia contemporânea. Seja em textos estrangeiros - já encenou Jon Fosse e Sarah Kane - seja em obras nacionais. "É um texto em que não se colocam personagens, enredo, linearidade. Não existem aí os elementos tradicionais do drama e esse sempre foi o nosso foco", comenta o diretor. "Outro aspecto que nos aproxima dessa obra e que já exploramos outras vezes é o fato de tudo acontecer dentro da mente da personagem, não necessariamente em ações."
Em Espasmo, o público acompanha os pensamentos de uma mulher. Aparentemente, ela está à beira da morte. E, em meio a um delírio, revisita episódios de sua vida. Retoma fatos, sensações e impressões. Mas essa é apenas uma das leituras possíveis, alerta a autora. "Ela pode estar morta, pode ser uma alucinação ou mesmo não ser real. O espectador tem que participar da criação da obra fazendo as suas leituras", diz ela.
A encenação proposta por Damaceno segue por este caminho: não entrega a quem assiste uma versão única do que se passa. Antes, oferta estilhaços dos vários olhares possíveis.
Duas atrizes interpretam, ao mesmo tempo, a protagonista. Imóvel, uma mulher nua (Maia Piva) aparece na penumbra. Apenas a luz se move e serve para criar imagens que extravasam o texto. Sugere deformações, ilusões de ótica, quase abstrações. Já o que ouvimos em cena vem de uma voz em off. Em uma cabine fora do palco, sem que a plateia possa perceber sua presença, é Rosana Stavis quem interpreta o texto. "Era preciso criar a ideia de que ouvíamos a voz desse corpo, de que era o próprio corpo que falava e não uma pessoa", observa o diretor.
Faz sentido se pensarmos nas proposições de Gabriela. "O que ouvimos não é necessariamente a voz dela. Mas vozes múltiplas que a atravessam. Não é a história de uma determinada pessoa, mas de qualquer um. A voz maternal, a voz feminina, a parcela de medo ou solidão que existe em todo mundo."
Rasgar o que temos por dentro. Esse parece ser o mote. "É algo recorrente na minha obra. Mostrar essas pessoas que estão mortas em vida, desconectadas de sua essência", comenta ela. Paradoxalmente, é na iminência da morte que a personagem de sua obra, antes anestesiada, experimenta seus momentos de maior intensidade. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
ÁRVORES ABATIDAS
Caixa Cultural da Sé (Praça da Sé, 111). Tel. (011) 3321-4400. Qui. e sex., às 19 h; sábados e domingos, às 18 h. Grátis. Estreia quinta-feira.