Gustavo Krause

Gustavo Krause

Livre Pensar

Perfil: Professor Titular da Cadeira de Legislação Tributaria, é ex-ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, no Governo Fernando Henrique, e da fazenda no Governo Itamar Franco, além de já ter ocupado diversos cargos públicos em Pernambuco, onde já foi prefeito da Capital e Governador do Estado.

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A Copa, o Gol e o Voto (I)

Gustavo Krause, | seg, 19/05/2014 - 13:09
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Nas Copas do Mundo, futebol e política andam juntos. O que difere é a finalidade e a intensidade com que são usados. No Brasil, análises e opiniões se dividem sobre a influência dos resultados nos campos sobre a decisão do eleitor nas urnas. O debate esquentou por aqui. O tema será tratado em dois artigos.

Além das funções organizadora e reguladora, a FIFA exerce um papel eminentemente político (209 filiados, 16 a mais do que a ONU). É detentora do poder máximo sobre as competições de futebol. Onde há poder, há política para o bem ou para o mal.

Escolher a sede da Copa é uma decisão política, ainda que apoiada em critérios objetivos e compromissos explícitos. A primeira Copa, realizada em 1930, por exemplo, contemplou o mérito do pequenino Uruguai, bicampeão olímpico (1924 e 1928).

Se, de um lado, a escolha da sede é política, de outra parte, os países escolhidos fazem uso político das copas de acordo com os interesses que permeiam a conjuntura histórica das nações. Neste sentido, vai da apropriação econômica do evento às possibilidades de legitimação do sistema de poder.

As Copas de 1934/38. Foram usadas como instrumento de  propaganda fascista. A ordem de Mussolini era “Vencer ou Morrer”. Os jogadores adiaram a morte. Em 38, o talentoso atacante, Meazza, ao receber a taça Jules Rimet, saudou o Presidente da França com o gesto fascista e passou para história como o único capitão de equipe campeã a ser estrepitosamente vaiado.

A Copa de 1950. A primeira depois da Segunda Guerra Mundial contemplou o Brasil, um aliado (apesar das hesitações getulianas) das forças que venceram os algozes da democracia liberal. Vargas sucedeu Dutra. Pelo voto. A profunda decepção com a Copa não mexeu com a fidelidade governista das urnas. Preterida a Argentina,  o Brasil mobilizou-se para mostrar ao mundo que era uma nação capaz realizar a copa, de construir o maior estádio do mundo e encantar o planeta com um futebol brilhante. O final infeliz a gente sabe: o “maracanazo”, a mais inesperada das derrotas; a mais desavergonhada politicagem em proveito da provável vitória; a alma brasileira ferrada pela novidade psicanalítica, o complexo de vira-latas.

A Copa de 1958. Um negro genial, adolescente, e um cafuzo de pernas tortas lideraram “o vareio de bola" que endoidou o sputinik, obrigou o Rei da Suécia a reverenciar o gesto imortalizado por Bellini e detonou o complexo. Ninguém, à exceção de Nelson Rodrigues, acreditava na seleção. A preparação adotou métodos modernos. O psicotécnico ferrou Garrincha. Os boleiros ferraram o psicotécnico e escalaram Mané. Naquela época, o Brasil vivia um momento mágico: Juscelino,  bossa-nova, democracia e progresso. O Brasil ganhou a Copa, marcou gols de bela feitura e as urnas funcionavam.

A Copa de 1970. Nesta época, não tínhamos copa, não tínhamos urnas e carecíamos de gol. A vitória opaca de 1962 fora soterrada pelo abalo sísmico do futebol-força de 1966. Tempos difíceis. O auge do ciclo militar: uma economia atlética e liberdades caquéticas. No futebol, descrédito. Aí a contradição inacreditável: um comunista de carteirinha, inteligência privilegiada e tamanha coragem que nele caberia o titulo de sua “Insolência João Primeiro e Único”, muda tudo. Saldanha abriu a jaula e colocou em campo 22 “feras”. O João Sem Medo arretou-se com interferências indevidas e jogou a toalha.  Antes, pavimentou o caminho para o disciplinado Zagalo e uma comissão técnica engalanada. Tiveram o bom senso de não misturar hierarquia, disciplina e a alegria libertária de jogar futebol. Juntaram grandes craques. Sem posições definidas e uma tarefa sagrada: tratar com carinho e intimidade sua majestade, a bola. Não deu outra: a taça Jules Rimet é nossa...para sempre.

A Copa de 1978. O refinado futebol argentino jamais precisou de governos civis ou militares para conquistar troféus. Porém, o ditador Jorge Videla precisava desesperadamente do título mundial. Para os donos do poder absoluto, não era suficiente a boa qualidade do time argentino. Armaram. A goleada dos argentinos na seleção peruana tirou o Brasil da final. Coutinho desabafou: “o Brasil é o campeão moral”. Este título não se contabiliza, mas um indigno conluio maculou a ética esportiva. (Continua amanhã(20), na próxima coluna)

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