Gustavo Krause

Gustavo Krause

Livre Pensar

Perfil: Professor Titular da Cadeira de Legislação Tributaria, é ex-ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, no Governo Fernando Henrique, e da fazenda no Governo Itamar Franco, além de já ter ocupado diversos cargos públicos em Pernambuco, onde já foi prefeito da Capital e Governador do Estado.

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As Duas Paixões de Getúlio

Gustavo Krause, | qua, 11/09/2013 - 12:13
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O segundo volume da biografia de Getúlio, Do Governo Provisório à Ditadura do Estado Novo (1930-1945), segue o rigor factual e analítico do primeiro volume.

A diferença consiste no seguinte: no primeiro, Getúlio, em formação, se encaixava nas circunstâncias históricas; no segundo, Getúlio, maduro, assume a centralidade do processo político.

No artigo, O lado escuro de Getulio, o jornalista Otavio Frias filho ressalta que o lado bom se manifestou no líder da revolução de trinta, no campeão dos direitos sociais e no líder nacionalista. O lado ruim se fez presente no chefe da única ditadura pessoal que o Brasil conheceu e o “político inescrupuloso aferrado ao poder”.

Por sua vez, Lira Neto considerou que sua maior dificuldade foi: “sintetizar o grande volume de informações a respeito do intervalo de tempo decorrido entre a posse de Getúlio no Catete e sua derrubada, por meio do golpe de Estado, em 1945”.

Acrescentaria ao “intervalo de tempo”, as grandes transformações que sacudiram o mundo e o Brasil, inclusive II Guerra Mundial onde se confrontaram duas visões de mundo: o modelo totalitário e a democracia liberal.

De outra parte, a brilhante narrativa funde as dimensões política e humana do personagem Getúlio o que permite identificar duas paixões que penetraram, cada uma a seu modo, o temperamento fechado, ensimesmado e, aparentemente, arredio ao apelo das emoções.

As duas paixões foram o poder e uma mulher.

O poder foi paixão e destino. A mulher, o alumbramento.

Do berço oligarca de São Borja até a tragédia do suicídio, Getúlio conviveu com  o poder exercendo-o pelo mando direto ou pela influência que, a bem da verdade, ainda se faz presente na história contemporânea com os traços da chamada “era Vargas”.

Líder provinciano, Getúlio foi dando saltos: deputado estadual por três vezes pelo Partido Republicano, deputado federal e líder da bancada, Ministro da Fazenda de Washington Luís a quem ajudou derrubar em 30, Governador do Rio Grande do Sul, com o mandato interrompido para assumir a candidatura de presidente da República pela Aliança Liberal em oposição ao candidato oficial Julio Prestes com o apoio de três Estados (Rio Grande do Sul, Paraíba e Minas Gerais) e o movimento tenentista.

A derrota fermentou a instabilidade política que culminou com a revolução de 30, sepultou a Repúbica Velha e instalou o governo provisório (1930-1934),  sequenciado pelo governo constitucional até o golpe de 37, entremeado pela cruenta revolução paulista de 1932.

Ao longo deste período, Getúlio revelou a esperteza do equilibrismo diante de fortes antagonismos. Metade conciliador, metade autoritário, soube aproveitar os fracassos da delirante Intentona comunista de 35 e o patético o “putsch” integralista (11 de maio de 38) para fortalecer a ditadura estadonovista.

Porém, o mais notável malabarismo foi tirar partido da Segunda Guerra Mundial. Entre flertes germanófilos e uma neutralidade conveniente, falou mais alto a pragmatismo getulista. O Brasil foi à guerra; os financiamentos dos EUA turbinaram a siderurgia e os pracinhas da FEB se imolaram pela pátria amada.

Por falar em amada, a segunda paixão de Getúlio foi uma bela e culta mulher, casada com seu oficial de Gabinete, Luis Simões Lopes, chamada Aimée a quem o Presidente tratava de bem-amada.

Neste sentido, O DIÁRIO DE GETÚLIO, publicado em 1995 pela Editora Siciliano e FGV, foi a fonte na qual Getúlio, em tom confessional, registrou no período de 03 de outubro a 30 de abril de 1942, fatos, impressões, lamentos e momentos do clandestino afeto que manteve por mais de dois anos.

O primeiro encontro social foi em 10 de Abril de 1936; em 17 de abril do ano seguinte, Getúlio escreveu: “Uma ocorrência sentimental de transbordante surpresa e alegria”; em 29 do mesmo mês, confessou: “saí à tardinha para um encontro longamente desejado": entre os dia 13 de 15 de outubro do mesmo ano, Getúlio registrou encontros, revelando uma confissão apaixonada: “Após os despachos, fui ao encontro de uma criatura que, de tempos a esta parte, está sendo todo o encanto da minha vida”; em 30 de março e 1938, Getúlio não contém o apelo carnal, em circunstâncias arriscadas: “O encontro se deu em plena floresta, à margem de uma estrada. Para que um homem de minha idade e da minha posição corresse esse risco, seria preciso que um sentimento muito forte o impelisse[...] Regressei feliz e satisfeito, sentindo que ela valia esse risco e até maiores”.

Pela mulher, a paixão foi infinita enquanto durou; o poder, paixão que acompanhou Getúlio do berço ao túmulo; sua existência e suas contradições invocam o poeta romano: "Sou homem: nada do que é humano me é estranho".

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