Pedreiro passa na federal, mas perde vaga. Famosos apoiam
Caso viralizou nas redes sociais e alcançou famosos como Luciano Hulk e a cantora Lexa
Seu Adenilton Nicolau, pedreiro de 47 anos, conquistou a internet após ser pré-aprovado no curso de filosofia da Universidade Federal de Goiás (UFG) em primeiro lugar na cota racial. O vídeo de reação de Adenilton viralizou e a celebração da família emocionou os internautas.
"Nossa, você vai estudar!", celebra a esposa. Em um tom de êxtase, o pedreiro reage à informação que tinha conquistado a vaga: "Melhor pontuação? Isso aqui é a nota do Enem? Nem sabia disso! Meu Deus, não acredito."
Adenilton seria o primeiro da sua família a ingressar na faculdade. Sua filha Sara Linhares, rapper e artista, foi quem gravou e publicou o vídeo que tem mais de um milhão de visualizações só no Twitter, foi quem fez a inscrição de seu pai no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e escolheu a opção de cota racial.
Adenilton e sua família. Foto: Arquivo Pessoal
"Minhas meninas sonharam para mim um sonho que eu tinha e a Sara me ajudou a realizar. Então quero agradecer a Sara por estar me dando todo o apoio aí e vou iniciar minha jornada agora fazendo filosofia na UFG. Obrigado, galera, por estar me apoiando", diz Adenilton em um segundo vídeo.
O desencanto
Porém, a comemoração não durou muito tempo. Após a pré-aprovação, o goiano foi realizar sua matrícula na universidade e foi impedido. A justificativa foi o ensino, para a cota racial, o vestibulando deve ter feito o ensino médio integralmente na escola pública, o que desclassificou Nicolau, que fez seu EJA em uma escola privada.
É gente, não deu certo...
— Sara Linhares (Ouça meu EP (@frozinhe) May 4, 2023
Quando fiz meu ensino médio, fiz por meio do EJA e na pressa por concluir rápido para melhores oportunidades de emprego, acabei fazendo a etapa final pela escola particular.
Na hora da matrícula nós usamos a cota racial e não nos atentamos ao pic.twitter.com/wFp1VYvoTx
Incapaz de completar seu ensino na escola enquanto criança, Adenilton parou de estudar desde os 13 anos e só foi capaz de terminar o ensino básico pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos), que entrou em 2012 sonhando em ter mais oportunidades com o diploma.
"Eu tentei o EJA na pública, mas eu precisava do diploma rápido porque com o diploma do ensino médio eu teria mais oportunidades e queria fazer um curso de mestre de obras. Na particular o EJA era mais rápido, com o horário mais flexível e por conta disso acabei optando por fazer na escola privada", contou Nicolau, em conversa com o LeiaJá.
Em um terceiro vídeo, Adenilton veio a público explicar a situação da sua vaga. O mesmo afirma que sua ficha 18, o certificado que comprova a conclusão do ensino médio, foi negada por ser de ensino privado. Sara Linhares, sua filha que popularizou a história, detalhou que a atendente da UFG chorou ao ter que cancelar a vaga de seu pai.
"Eu tô triste. Estou sorrindo aqui, mas só Deus sabe como eu estou por dentro. Eu quero continuar sendo uma fonte de inspiração, mas eu estou triste por quê? Nós fizemos a inscrição na faculdade na UFG, minha filha usou o sistema de cota racial e usando a nota do Enem que eu fiz também. Eu fui aprovado, só que todo o sistema de cota, você tem que vir de um ensino médio público", explica o pedreiro.
"Quando eu apresentei meu diploma lá para fazer a matrícula, veio de uma escola particular, então foi barrado por isso. Nós não tínhamos nos atentado para esse item que tem que ser de uma escola pública. Então eu passei em todas as etapas, menos nessa, então fui barrado. Por isso eu estou muito triste", continuou.
A família
Em relatos no seu perfil, Sara mencionou que se sentiu culpada pelo que aconteceu com seu pai, mas pediu para que ninguém utilizasse isso de motivo para falar mal de universidades públicas, que apenas está seguindo o que está na lei.
"Não foi erro da universidade, está claro no edital. O erro foi meu, eu matriculei o meu pai em horário de serviço, não lembrei que ele fez uma etapa do EJA dele numa escola particular e o diploma dele foi emitido pela escola particular. Então ele acaba por não se encaixar na cota", reitera a artista.
Foto: Arquivo Pessoal
Duas das filhas de Nicolau declararam que são contra qualquer comentário descredibilizando a universidade pública. Ambas são, inclusive, matriculadas em faculdades públicas e Sara é, especificamente, da UFG. Mariana Musgo, irmã de Sara e Filha de Adenilton, defende a importância das cotas mas também a reflexão sobre elas:
"A política de cotas é extremamente importante, teve um ingresso enorme [na universidade] de uma população que não teria, mas deveria olhar caso a caso. Meu pai é um pedreiro, tem três filhas, a gente mora na região periférica de Goiânia e ele não tá em paridade de concorrer em ampla concorrência, sabe?"
As irmãs mencionam que a viralização do caso de seu pai teve lado positivo e lado negativo. Apesar de todo apoio e mensagens de incentivo, elas encontraram muito comentário maldoso e de ódio voltado a sua família. Contudo, as coisas boas se destacaram, em especial as oportunidades que apareceram para eles.
O futuro
Conseguir a vaga e perder ela em menos de 48h foi um baque grande, mas não grande o suficiente para fazer Adenilton desistir em nenhum momento. O mesmo, apesar de estar triste, sempre declarou que continuaria na pesquisa de uma universidade para conquistar seu diploma.
"Meu sonho não morre aqui, não vou desistir, tá? Eu vou procurar uma faculdade, que seja particular mesmo para terminar esse curso em nome de Jesus", afirma o goiano.
Assim como milhares de pessoas, alguns famosos também tiveram contato com essa história. O apresentador Luciano Huck compartilhou o caso em seu perfil nas redes sociais e a cantora Lexa entrou em contato direto com a família de Goiás.
A artista mencionou que ficou muito feliz e orgulhosa pela luta e amor de Nicolau pelos estudos e por isso se ofereceu para pagar uma faculdade particular para ele. Adenilton conta que ainda está digerindo essa informação, mas está muito contente com tudo.
Outras faculdades também estão entrando em contato, oferecendo uma vaga nos em seus cursos para que ele consiga realizar seu sonho de ingressar na faculdade, aos 47 anos. Sara acredita que o sonho do seu pai não é um sonho que acabou, mas sim um sonho que começou agora.