MP investiga pastor por demonizar arte sobre religião afro

Painel foi pintado no Túnel da Abolição, no bairro da Madalena, Zona Oeste do Recife

sex, 06/08/2021 - 11:19
Divulgação/Priscilla Melo MPPE investiga possível ato de ódio e preconceito religioso perpetrados pelo pastor Divulgação/Priscilla Melo

O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) instaurou um inquérito civil para investigar possível ato de ódio e preconceito religioso contra religiões afro-brasileiras perpetrados por um pastor. Em um vídeo publicado no Instagram, Aijalon Heleno Berto Florêncio critica um painel artístico pintado no Túnel da Abolição, no bairro da Madalena, Zona Oeste do Recife, dizendo se tratar de "reverência a entidades satânicas".

"Esse painel, na verdade, representa um ponto de contato com forças místicas intrinsecamente ligadas à feitiçaria, entidades reverenciadas nos terreiros, no Candomblé. Esse painel aí é, nada mais, nada menos, do que uma reverência a entidades malignas, satânicas, espíritos das trevas, à luz da palavra de Deus. Você precisa entender que essa palavra bonita ‘retorno à ancestralidade’ é, nada mais, nada menos, do que uma redescoberta dos poderes místicos das trevas que energizam o Candomblé, a umbanda e as religiões de matrizes afro", diz o religioso.

O vídeo gerou uma série de notas e manifestações de repúdio por parte de coletivos, terreiros, artistas e praticantes e não praticantes de cultos de matriz africana. A abertura de inquérito ocorreu após denúncia do Conselho Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Coepir) e da Rede de Mulheres de Terreiro de Pernambuco.

Após a repercussão do vídeo, o pastor voltou a se manifestar na sua conta no Instagram. "Querem criminalizar a nossa fala bíblica. Não há instância jurídica nesse Brasil que tenha o poder de sequestrar a consciência profética de um pastor e a liberdade de crença", afirmou em outra gravação. 

Segundo o promotor Westei Conde y Martin Júnior, da promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, a conduta do pastor configura, em tese, crime contra o sentimento religioso e violação da Lei Antidiscriminação e "representa ainda manifesta ofensa aos direitos fundamentais de liberdade de consciência e de crença". O pastor deverá comparecer em audiência virtual para prestar esclarecimentos sobre o caso.

A Rede de Articulação da Caminhada dos Terreiros de Pernambuco também ingressou, na última quinta-feira (29), com uma notificação extrajudicial contra o Facebook exigindo a remoção do vídeo do pastor. 

A intervenção no Túnel da Abolição faz parte do projeto Colorindo o Recife, uma política pública de fomento à arte urbana que teve início em 2013. Os trabalhos foram feitos por Adelson Boris, Nathê Ferreira e Emerson Crazy. O painel, com o tema 'Do Orun ao Aiye: África Elementar', faz reverências a ancestralidades afro-brasileiras, como Ogun e Oxossi.

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