Anac diz que voo de Agnelli era irregular
O empresário e outras seis pessoas morreram após queda do avião, às 15h23 do sábado (19)
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou na segunda-feira (21) que o avião experimental de Roger Agnelli, ex-presidente da mineradora Vale, não tinha permissão para sobrevoar áreas densamente povoadas, como é o caso do entorno do aeroporto Campo de Marte, na zona norte de São Paulo.
O empresário e outras seis pessoas morreram após queda do avião, às 15h23 do sábado (19), em uma casa próxima do local, pouco depois da decolagem. "A Agência esclarece que a aeronave não poderia sobrevoar áreas densamente povoadas, por se tratar de aeronave experimental sem autorização específica", afirma a nota da Anac.
Conforme mostrou a reportagem, a categoria experimental em que se enquadrava o avião usado pelo ex-presidente da Vale deveria seguir restrições definidas pela Anac. O equipamento, modelo CA-9, foi fabricado em 2012, tinha capacidade para sete passageiros e estava no nome de Agnelli como proprietário e operador. Por ser experimental, a caixa-preta não era obrigatória. "Pelo mesmo motivo, toda a operação da aeronave é sob conta e risco do proprietário e do piloto", diz a agência.
A Anac divulgou ainda que não recebeu confirmação oficial sobre se o comandante Paulo Roberto Bau, que também morreu no acidente, era o piloto em comando do voo. "Essa informação deve ser checada com a Polícia Civil ou com o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa)." A reportagem procurou a assessoria da família Agnelli, mas não obteve reposta.
Regras
Embora o Código Brasileiro de Aeronáutica estabeleça que todas as aeronaves devem ser certificadas, a legislação permite o uso de modelos considerados amadores, que recebem autorização para voar sem a necessidade de atender aos requisitos para a homologação aeronáutica. Esses aparelhos podem até usar peças genéricas e usadas - que custam até 10% do valor das oficiais -, sem controle sobre a manutenção, que fica a cargo dos donos.
O uso desses "protótipos" tem sido questionado por especialistas pela suposta falta de segurança. O professor de Engenharia Aeronáutica do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) Cláudio Jorge Pinto Alves, também especialista em infraestrutura aeroviária, disse que os aviões experimentais não devem ser vendidos comercialmente. "Para que isso fosse feito, os aviões precisariam passar por todas as baterias de testes e obter uma certificação da Anac, autorizando a venda. Mas se isso fosse feito, as aeronaves deixariam de ser experimentais e o preço aumentaria", afirmou.
Segundo ele, aviões como o do ex-presidente da Vale têm sido usados da mesma forma que outros modelos comerciais. "Muita gente compra a aeronave porque é mais barata, não tomando conhecimento do risco que está correndo."
Acidentes
Levantamento obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que pelo menos uma aeronave experimental sofre acidente por mês no Brasil. Dados do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) apontam que houve 135 acidentes com aeronaves experimentais entre 2005 e 2014. Destes, 56 foram fatais e resultaram em 82 mortes. Os números foram compilados em dezembro do ano passado e são os mais recentes disponíveis.
De acordo com informações disponíveis no site da Anac, este tipo de aeronave representa praticamente um quarto de todas as 21.789 existentes no Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB), ou 5.158. Em 2008, eram apenas 3.376 experimentais.
Apuração
A Polícia Civil instaurou inquérito para apurar as responsabilidades do acidente. O delegado Marcio Martins Mathias, titular do 13º DP (Casa Verde), informou que o caso foi registrado como homicídio culposo e dano. "Serão apuradas as causas do acidente. Se houve negligência, imprudência, imperícia, enfim, todas as hipóteses serão investigadas", disse.
O proprietário da residência atingida pelo monomotor prestou depoimento ontem. Nos próximos dias, serão chamados para prestar depoimento funcionários do Campo de Marte e também familiares de Agnelli. Peritos do Instituto de Criminalística estiveram no local logo depois da queda do monomotor. (Colaboraram Alexandre Hisayasu e Rafael Italiani)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.