América do Sul pode perder vaga na Copa do Mundo de 2018
Europa avisa: quer mais vagas para suas seleções que venceram os três últimos Mundiais
Sem poder mais contar com a influência de João Havelange, Julio Grondona e Ricardo Teixeira e com um resultado esportivo abaixo de sua média histórica, a América do Sul corre o risco de perder uma vaga para a Copa do Mundo de 2018. Em maio, a Fifa vai anunciar quantos lugares dará para cada continente no Mundial e, em plena campanha eleitoral, o presidente da entidade Joseph Blatter não hesita em fatiar a competição para ganhar apoio. Enquanto isso, a Europa avisa: quer mais vagas para suas seleções que venceram os três últimos Mundiais.
Hoje, a Conmebol é a associação regional mais representada proporcionalmente em um Mundial. Dos dez países que formam parte do bloco, quatro ganham classificação direta e um quinto lugar disputa repescagem, normalmente contra uma equipe fraca da Ásia, América Central ou Oceania. Desta vez, porém, a Europa deixa claro que chegou o momento de rever a divisão de vagas para as 32 seleções que irão à Copa. Para 2018, a Uefa quer passar de 13 para 14 ou 15 seleções no torneio, incluindo os anfitriões russos.
A proposta foi oficialmente apresentada em março por Gianni Infantino, secretário-geral da Uefa, aos 54 membros do bloco europeu, em reunião em Viena. "Temos uma grande chance de ter mais de 13 lugares", disse. "Se considerarmos fatos objetivos, temos 19 seleções nas 32 primeiras posições do ranking mundial. Os vencedores das três últimas Copas foram europeus (Itália, Espanha e Alemanha) e, portanto, seria justo pedir mais uma vaga", insistiu. Para ele, a Copa precisa ocorrer "entre os melhores".
Para os europeus, está muito claro: a Conmebol terá de ceder. Na prática, se tal redução ocorrer, a disputa por vagas entre as seleções da região promete se transformar em uma das mais emocionantes. Se há dez anos Brasil, Argentina e Uruguai eram os líderes incontestáveis do continente, hoje precisam disputar o espaço com Colômbia, Chile, Paraguai e Equador. Peru, Bolívia e Venezuela correm por fora.
Em março, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ex-presidente da CBF, José Maria Marin, deixou claro que as Eliminatórias da Copa de 2018 podem ser o momento mais delicado da história do futebol nacional. Entre cartolas da Conmebol, a expectativa é de que, mesmo sem o corte de uma vaga, a disputa seja a mais emocionante já vivida pela região. "Pelo menos seis seleções têm chance real de ter uma vaga na Copa", disse um deles, na condição de não ter o nome revelado.
PRESSÃO - Mas a pressão sobre os sul-americanos não vem apenas da Uefa. Outros continentes insistem que, se de fato o evento é global, não seria equilibrado manter um sistema em que quase metade dos sul-americanos vão ao Mundial. Blatter, em buscas de votos para sua reeleição, declarou diante dos países da Concacaf (América do Norte e Central) nesta semana que a região deveria passar de três vagas e meia para quatro. "Se a Copa ficar com 32 times, defendo que a Concacaf tenha quatro lugares", declarou o cartola, que fez os membros do bloco se levantarem para aplaudi-lo, em encontro nas Bahamas.
Em 2014, a Concacaf mandou quatro seleções para o Brasil, mas apenas graças a uma vitória do México na repescagem contra a Nova Zelândia. O debate se transformou em uma barganha política, às vésperas da eleição presidencial na Fifa. Grupos, como o da Oceania com onze seleções, deixaram claro a Blatter que vão apoiá-lo se conseguirem pela primeira vez uma vaga automática no Mundial. A região é a única do mundo que não tem representação garantida, o que fez a Austrália passar a disputar torneios asiáticos.
Os asiáticos também se queixam de estarem sub-representados. Com 47 membros, eles têm o mesmo número de vagas que os sul-americanos, com apenas dez seleções na região. Se o desempenho em campo foi decepcionante para os asiáticos em 2014, o bloco tem a economia que mais cresce no mundo e é considerado como a nova fronteira dos negócios do futebol.
Se por anos a Fifa contou com um peso grande de sul-americanos no controle da entidade, a realidade é que Blatter praticamente não precisa prestar contas à região. Havelange deixou de ser influente desde que perdeu o cargo de presidente de honra da Fifa por seus escândalos de corrupção. O argentino Grondona, que era quem mandava nos cofres da entidade, morreu no ano passado. Já Ricardo Teixeira foi afastado.
Marco Polo Del Nero, presidente da CBF, garante que tanto ele quanto o restante da Conmebol votarão por Blatter nas eleições. Mas a nova geração de cartolas sul-americanos não conta com a mesma influência e insiste que a região precisa manter suas vagas diante do histórico de nove títulos mundiais. "O momento não é de história. O momento é de política e de negócios", alertou um experiente cartola europeu e que, há anos, circula pela entidade.
BARGANHA - A atitude de Blatter de sair em busca de votos usando o Mundial já tem sido duramente criticada por seus adversários. O cartola suíço convocou uma reunião da Fifa para o dia seguinte à eleição, 30 de maio, justamente para definir as novas vagas. A decisão provocou a ira dos concorrentes de Blatter, que o passaram a acusar de barganhar votos por lugares na Copa.
"Minha preocupação é a de que essa decisão de vagas seja usada por razões políticas ao se fazer promessas que podem não ocorrer", alertou Ali bin Al Hussein, atual vice-presidente da Fifa e que concorre contra Blatter nas eleições. Michel Platini, presidente da Uefa, também atacou. "Blatter está jogando com a alocação de lugares para a Copa."