Vício em tecnologia prejudica aprendizado e networking
Especialistas alertam para os problemas causados pelo uso excessivo de celulares e outras tecnologias. Dependência deve ser tratada com auxílio de médicos.
Paulo Henrique Melo só não usa o celular quando está dormindo. Mas basta acordar para que suas relações fiquem restritas à mediação do aparelho, desde as conversas com a família e amigos no Whatsapp, até as contas que paga pelo internet banking. O dia se desenrola entre os assuntos de trabalho pelo Gmail, estudos e lazer no IBooks, compras de viagens no Decolar.com... Olhos vidrados na tela.
O jovem universitário de 21 anos é um dependente das tecnologias. Assim como milhares de pessoas no mundo, se o Wi-Fi desligar, a bateria acabar ou faltar luz, Paulo não sabe o que fazer. Longe do Brasil em um intercâmbio do programa Ciência Sem Fronteiras, em Budapeste, ele se sente nu sem o telefone: "Minha vida toda está no celular".
O incrível desenvolvimento tecnológico gerou na sociedade uma grande necessidade de se passar cada vez mais tempo em conexão com redes sociais, Facebook, Twitter, Instagram, WhatsApp, Snapchat, colocando em risco não só a saúde física e psicológica, mas prejudicando o convívio social e aprendizado.
Do ponto de vista médico, é identificada dependência de tecnologia quando a pessoa não consegue administrar de forma sadia o uso dessas ferramentas, causando prejuízos no trabalho e no convívio social.
As telas, sejam elas de celulares, laptops, computadores, tablets, televisões e outros dispositivos, têm pautado as relações pessoais na atualidade. Sem esses dispositivos, provavelmente o mundo inteiro sentiria os mesmos efeitos de um dependente químico em abstinência.
"Chego a imaginar crises de abstinência se, de repente, ficasse muitos dias afastado dos meus aparelhos", admite Paulo Henrique, acostumado a usar computador, celular e televisão ao mesmo tempo.
"O celular pode ser responsável pelo meu atraso em compromissos, pois não paro de mexer nele enquanto me arrumo, além do fato de que minha dedicação insuficiente em atividades importantes do meu cotidiano, como o estudo, trabalho, ocorre pelo fato de que não consigo passar mais de uma hora sem mexer nele", afirma o universitário.
Patologia – Relações no trabalho, família, estudo, amigos... Tudo é afetado pelo uso excessivo das tecnologias. Mas existem variações de dependência: a considerada normal e a patológica, que necessita de um acompanhamento médico, pois pode acarretar ansiedade, depressão, transtornos sociais e déficit de atenção.
Para a professora e especialista em neuropsicopedagogia Paula Barros, a participação da família é fundamental para o diagnóstico, pois ela pode fornecer informações sobre o comportamento, atitudes e sobre o cotidiano do “viciado”, que, por muitas das vezes, acaba omitindo informações.
Mas como identificar na prática se uma pessoa é viciada em telas? As irmãs Maria Luiza e Maria Vitória Oliveira, de 4 anos, estão em uma fase importante para o desenvolvimento motor, mas não querem saber de lápis, giz de cera, papel, tinta.
O que antes era diversão para as meninas, hoje é feito de maneira diferente, através de telas, pinturas digitais. Além do vício em tablets, as gêmeas não saem da frente da televisão: adoram programas educativos como Hi-Five, Dora Aventureira e Go Diego Go.
A especialista Ana Paula Barros afirma que crianças e jovens são os mais afetados pelas tecnologias, por passarem muitas horas em contato com aparelhos eletrônicos, o que acaba afastando-os do convívio social, com possibilidade de gerar dependência. “O mundo mudou e isso acaba interferindo no lado comportamental dos sujeitos. Hoje em dia é mais cômodo e prático brincar com jogos no celular do que jogar peteca com os amigos”, afirma.
O comunicólogo Mário Camarão, doutorando em cibercultura e redes de comunicação, utiliza as telas com consciência, mas diz que seria muito difícil passar uma semana sem acesso aos aparelhos: “Através da internet conseguimos superar grandes distâncias e encontrar soluções para problemas do nosso dia a dia. Uso para fins profissionais, pessoais e educacionais”.
O pesquisador ressalta que o maior problema é a substituição de relações reais pela mediação excessiva. “Tudo em demasia não faz bem. O bom senso é sempre o limite para o excesso”.
Por Raissa Craveiro